sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Pânico


 O roteiro de Kevin Williamson, dirigido com o máximo de criatividade por Wes Craven é um paradoxo na forma com que mostrou-se revolucionário: Naquele final dos anos 1990 de então, os realizadores conseguiram entregar um filme recebido como divisor de águas no gênero do terror contemporâneo, simplesmente versando em torno dos clichês inapeláveis desse mesmo gênero –e, no final das contas, não lhes acrescentando nada genuinamente novo.

A beleza de “Pânico” está, portanto, na sedução com que consegue enredar seus expectadores, e para isso, um diretor profundamente conhecedor das engrenagens que movem o gênero, como Wes Craven, é essencial.

Desde seu prólogo –onde vemos uma jovem Drew Barrymore, às voltas com um ameaçador telefonema de um psicótico que, descobrimos, está rondando sua casa –“Pânico” é todo metalinguagem: Os personagens, fãs incondicionais de filmes de terror ‘slasher’, debocham das decisões redundantes das vítimas dos assassinos (que insistem em correr escadas acima, por exemplo, ao invés de saírem porta afora) para, no momento seguinte, serem levados a cometer os mesmos lapsos.

A preencher esse amálgama ininterrupto de referências, o roteirista Williamson até que soube construir uma trama suficientemente envolvente: Após o assassinato de Casey (a personagem de Drew), um toque de recolher instala-se na cidadezinha de Woodsboro, com as autoridades temerosas de novos assassinos, a mídia subitamente interessada nos desdobramentos naquela comunidade pacífica e os jovens  tecendo teorias e mais teorias a partir dos filmes de psicopata que conhecem.

A protagonista de “Pânico” é Sydney (Neve Campbell, então em alta pelo sucesso do seriado “O Quinteto”) e, em poucos dias, há de completar um ano do assassinato da própria mãe dela; crime que muitos insistem em relacionar com as novas mortes.

De fato, Sydney, cujo pai saiu em viagem, deixando-a sozinha em casa, é assediada pelo assassino (um psicopata que usa uma máscara inspirada na pintura “O Grito”, do artista Edvard Munch), usando o mesmo recurso do telefone da vítima anterior: Ameaçadoramente, ele propõe um jogo de perguntas e respostas sobre filmes de terror, à medida que vai revelando sua presença próxima e letal –na cartilha de Wes Craven e Kevin Williamson, “Pânico” surge como um herdeiro natural de “Halloween” e “Sexta-Feira 13” (filmes com os quais a premissa é deliberadamente similar) ao introduzir um psicopata com elementos visuais icônicos à exemplo de Michael Meyers e Jason Vorhees, mas incrementado pelas artimanhas tecnológicas que o conectam aos jovens (o telefone) e por sua própria percepção cultural (os filmes de terror).

É também curioso notar que Craven humaniza o psicopata: Ele cai, se machuca e apanha de suas vítimas antes de matá-las, o que serve não necessariamente para humanizá-lo (embora isso aconteça) mas, mais precisamente para relacioná-lo com os suspeitos que vão despontando. Um elemento que garante diversão e interesse à “Pânico” –pelo menos, nas primeiras vezes a que se assiste a ele –são as incertezas quanto à identidade real do assassino: Seria o namoradinho de Sydney (Skeet Ulrich, de “Jovens Bruxas” e “Melhor É Impossível”) cheio de desculpas esfarrapadas e histórias mal-contadas? Ou seria o nerd de locadora Randy (Jamie Kennedy, possivelmente o melhor personagem do filme) cujas observações sobre os códigos embutidos nos filmes de terror são um dos grandes achados do filme?

A resposta que “Pânico” fornece –e que vem após uma sucessão estilística de mortes e corre-corre ao gosto dos jovens sedentos por sangue e adrenalina –é mirabolante e cheia de desdobramentos absurdos; e, por isso mesmo, divertidíssima!

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