O diretor Takashi Miike adentra esta obra estranha com o mesmo entusiasmo que ele reservou aos seus mais ecléticos e bizarros projetos. O convencional nem um pouco interessa à Miike; ele prefere explorar as fusões improváveis e até desconcertantes para delas extrair o cobiçado diamante da originalidade, nem que para isso, até chegar lá, muita coisa non-sense e grotesca seja produzida.
E “A Felicidade dos Katakuri” é, acima de tudo,
isso: Sem noção e grotesco; uma comédia de humor negro, meio terror, meio
musical (!), pontuada em algumas de suas passagens (provavelmente aquelas que
exigiriam mais do baixo orçamento da produção) por uma desmazelada animação
stop-motion.
A Família Katakuri é formada pelo pai (Kenji
Sawada, de “Mishima-Uma Vida Em Quatro Tempos”), pela mãe (Keiko Matsuzaka, de
“Cão Danado”), e pelo avô (Tetsurô Tamba, de “O Samurai do Entardecer”), além
dos filhos Masayuki (Shinji Takeda, de “Tabu”) e Shizue (Naomi Nishida), cuja
filhinha Yurie (Tamaki Miyazaki), é também a inocente narradora desta abilolada
história.
Sonhador, o patriarca adquire uma pousada com
intenções empreendedoras: As obras de uma vindoura rodovia indicam que a
estrada passará pela residência tornando-a um ponto importante para viajantes
pernoitar. Mas, os atrasos das obras mergulham os Katakuri num marasmo de
frustração e ócio, enquanto se ocupam de implicar uns com os outros.
Quando os hóspedes finalmente começam a
aparecer, a boa-venturança não tarda a converter-se em encrenca: O primeiro é um
suicida que termina virando cadáver pelas próprias mãos dentro do quarto
alugado; e a saída dos Katakuri, temendo a má publicidade da notícia de um
suicídio em sua pousada, é ocultar o corpo morto (!).
O segundo hóspede, um famoso lutador de sumô e
sua namorada adolescente (!!), tem destino igualmente fatídico: Ele morre de
tanto fazer sexo (!!) tendo, inclusive, esmagado a garota na cama (!!!). E
assim, lá vão os Katakuri enterrar mais alguns defuntos!
Equilibrando essa sucessão de absurdos (os
quais não param por aí!) com ocasional e indisfarçável propensão ao mau gosto,
Takashi Miike pontua o avanço dessa narrativa tão mórbida quanto avacalhada com
números musicais, os quais refletem, inclusive, o desleixo acarretado aos
atores/personagens que desafinam na hora de cantar e se atrapalham na hora de
dançar –é como se Miike deixasse que a perplexidade desvairada afetasse as
sequências musicais, afinal, as músicas aparecem sempre nos piores momentos:
Quanto um corpo morto é descoberto; quando o pretendente de Shizue, um falsário
cujas mentiras são óbvias para todos menos para ela, declama suas
inconvenientes intenções ‘românticas’ a cantar em um lixão (!); no instante em
que os cadáveres enterrados emergem da terra, putrefatos; no momento em que todos, indignados, já
pensam em entregar-se à polícia, e assim por diante –nenhuma dessas deixas
corresponde aos momentos usuais, de musicais usuais, em que as canções normalmente
seriam introduzidas.
O resultado de tudo isso certamente é inusitado
e, embora não ofereça o choque visual de outras obras de Miike, conserva ainda
seus extremismos: Pois a premissa, como dito acima, não se satisfaz com o
inacreditável de sua situação inicial, e tudo se torna ainda mais absurdo e
ultrajante; até mesmo um vulcão (!), em dado momento, eclode na vizinhança dos
Katakuri.
Nenhum comentário:
Postar um comentário