“Através da 8ª Dimensão” é o subtítulo que sucede o título desta obra oitentista, vítima de extrema incompreensão à época de seu lançamento em 1984, mas redescoberta ao longo dos anos como um entretenimento peculiar e curioso.
Muito se discorre sobre as alegorias embutidas
no conceito amalucado de “Buckaroo Banzai”, como se o grupo Monty Python
tentasse criar uma história com ecos de 007 e de adaptações de histórias em
quadrinhos, e nela depositasse observações sobre a cultura pop e sobre a
maleabilidade dos sentimentos, apoiada nas mais inusitadas referências
possíveis.
O personagem título, Buckaroo Banzai
(interpretado por Peter Weller, ator de “Robocop” e “Mistérios e Paixões”,
estreando no cinema) é a um só tempo neurocirurgião, piloto de testes e dono de
uma banda de rock (!?) e seu objetivo de vida é, ao lado de sua trupe de
amigos, nomeados Hong Kong Cavaliers (que reúne caras como Lewis Smith, Jeff
Goldblum, Clancy Brown e Pepe Serna), experimentar ao máximo de aventuras.
Uma delas tem início quando, tão logo deixa uma
mesa de operação, ele quebra a barreira do som a bordo de um carro de corridas
turbinado. Não apenas a barreira do som, Buckaroo rompe também, por breves
momentos, o fino tecido da realidade, indo parar em um lugar que seu pai (que,
por sinal, é cientista) chama de 8ª Dimensão!
O feito de Buckaroo desperta a atenção de um
certo Dr. Emilio Lizardo (John Lithgow, perfeito em sua insanidade), cuja
tentativa de realizar a mesma experiência décadas antes o levou a ser possuído
por um alienígena vindo dessa tal 8ª Dimensão –situação que, desde então, o
confinou numa espécie de sanatório. Escapando de lá, e reunindo outros
comparsas, também eles, alienígenas disfarçados entre pessoas comuns (entre os
quais, Christopher Loyd, Vincent Schiavelli e Dan Hedaya), o Dr. Lizardo se
apressa em roubar da equipe de Buckaroo os artefatos necessários para repetir a
experiência e voltar para casa.
Contudo, nada é tão simples: Os alienígenas,
malvados ainda que ineptos, querem também achar um jeito de dominar o mundo, e
em sua periculosidade, são vigiados do espaço sideral por outros de sua mesma
raça, mais austeros, que estão prontos para fulminar a Rússia com um raio caso
esses bandidos escapem até o pôr-do-sol, criando um impasse que levará a uma
guerra nuclear, e a Terra à destruição. Assim, Buckaroo Banzai –que se vê
envolvido na súbita descoberta de uma sósia (ou seria irmã gêmea?) de sua
esposa falecida, vivida em ambos os casos por Ellen Barkin –acaba se tornando,
ao lado dos Hong Kong Cavaliers, um improvável herói predestinado a salvar o
planeta.
Essa explicação, no entanto, não chega a
ilustrar com satisfação o que o filme dirigido por W.D. Richter (e roteirizado
por Earl Mac Rauch a partir de uma ideia dele) chega a ser: Inspirado pelos
filmes de matinê que Richter, e diversos outros autores da época conferiram em
sua infância, “Buckaroo Banzai” é uma miscelânea bizarra, lisérgica e algumas
vezes sem sentido entre aventura, ficção científica e delírio autoral. Seu
enredo não se acomoda em nenhum gênero e sua cenas exalam um certo
inconformismo bizarro, carregadas de informações, adornos e referências
constantes plantadas nos mínimos detalhes e, ainda assim, ostentando um ritmo
desigual, que parece ficar lento justamente nas cenas de ação (!), o que leva o
expectador a uma curiosa sensação de desconforto em relação ao material, e pode
ser fruto, talvez, da inexperiência do diretor Richter em construir uma
narrativa –afinal, este foi seu primeiro trabalho.
Entretanto, se a estranheza é o charme de “As
Aventuras de Buckaroo banzai”, ela é também uma característica quase
involuntária diante da execução intuitiva de seu projeto.
Ao longo dos anos, muitos foram os que
tentaram, sem sucesso, explicar os propósitos, intenções e objetivos por trás
de “Buckaroo Banzai” –para uns, é um passatempo lisérgico sobre as ameaças
metafísicas do universo transfigurado por um humor nonsense e deliberadamente
inapropriado; para outros, um tratado alegórico sobre paranóia, sobre o estado
de coisas alienado da década de 1980 e, ao mesmo tempo, um exercício estético e
colaborativo sobre o caos e a anarquia –inclusive essa, digamos, esquizofrenia
visual, que contamina muitas de suas passagens, pode ser explicada pela troca
de diretores de fotografia, tendo o estiloso Jordan Cronenweth (de “Blade Runner”) sido substituído, no meio do filme, pelo mais convencional Fred
Koenekamp.
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