O francês “Souffle Au Cour” é um filme de
camadas que, sobrepostas, umas às outras, se complementam, se confundem e se
fundem, como as mais boa e abstrata poesia. É também de uma delícia sem fim
assistí-lo.
Louis Malle tece uma teia delicada de
acontecimentos imprevisíveis a reger seus personagens, entre eles, a mãe e o
filho.
Aos quinze anos de idade, o temperamento de
Laurent reflete o tumulto hormonal em seu organismo: Entra em atrito constante
com seus provocadores irmãos mais velhos, mostra-se rebelde, não se dá com o
pai.
Na mansão de classe burguesa em Dijon, onde
mora, o único oásis de ternura em meio às ferrenhas disputas domésticas é
Clarisse, sua mãe. E ao compor com graça e calor humano esse papel, Lea Massari
é o sol que ilumina o filme. E quando ela não está por perto ele é frio,
sombrio até.
A grande contribuição desta obra no que tange ao propor
uma revisão às convenções, surge na forma com que Malle rege o ato final,
quando Laurent e Clarisse –mãe e filho –vão juntos a uma clinica de tratamento
devido à uma escarlatina que o jovem contraiu.
Um clima de tensão sexual –ainda que inebriante
e afetuoso –toma conta de mãe e filho durante as festividades de 14 de julho, e
um ato de sedução se consuma.
Nessa cadência de sentidos e significados, de
observações e descobertas, Malle subverte, por meio da ambigüidade, o que nos é
inerente como história, simplesmente permitindo um desenrolar natural do que
vemos à nossa frente.
Ele revela habilidade ao desvencilhar o incesto
de qualquer culpa, numa atitude que absolutamente deve soar anticlerical: Seu
filme, tão calmo e parcimonioso, tão sutil e aparentemente inofensivo se constrói
de pequenas transgressões que juntas dão um idéia do que realmente Malle quer
elaborar –uma visão algo anarquista onde os pilares do que se tem por sociedade
(família, escola, igreja) são confrontados, e uma ordem de noção mais íntima é
sugerida e então estabelecida.
É um trabalho de indescritível coragem e de
insuspeita maestria.
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