Particularmente nunca me empolguei tanto com o
trabalho de Robert Altman a ponto de incluí-lo na lista de maiores diretores do
cinema como muitos já o fizeram. Seus filmes em geral pareciam ter uma barreira
de inteligibilidade que os impedia de atingir grandezas absolutas que outros
mestres da arte obtêm com mais facilidade.
Mas, houve grandes obras que ele soube conceber.
“Short Cuts-Cenas da Vida”. “O Perigoso Adeus”.
“O Jogador”.
É no meio termo entre tais extremos –a excelência
de suas obras mais consagradas e a restrição estilística de outros trabalhos –que
parece se encontrar o surreal “Imagens”.
Ainda que pode-se perceber aqui, mais do que em
seus outros filmes, nos quais emprega um estilo específico e centrado, uma
influência maior de Altman por prováveis ídolos. E eles são Roman Polanski (“Repulsa
Ao Sexo”) e Ingmar Bergman (“Persona”).
São dois autores aos quais “Imagens” deve
muito.
Susannah York interpreta (magnificamente bem,
diga-se) Cathryn, uma escritora de histórias infantis dilacerada por uma
possível infidelidade de seu marido, Hugh (Rene Auberjonois).
Surtos de esquizofrenia, que aparentam ficar
cada vez mais intensos, depois que os dois decidem passar algum tempo numa casa
isolada no campo, pioram ainda mais a situação.
Aos poucos, descobrimos que tais suspeitas que
a corroem são, de certa forma, reflexos de sua própria culpa: Cathryn, ela
própria, foi infiel à Hugh, com um francês, Rene (Marcel Bozzufi), falecido à alguns
meses, e depois com Marcel (Hugh Millais), amigo de seu marido.
Há um jogo de reflexos com quais Altman brinca
o tempo todo, dentro e fora do filme: Além do evidente quiproquó usado nos nomes dos três personagens masculinos (e nos nomes dos atores que os interpretam), também há uma personagem intrigante, a filha de Marcel, Susannah, interpretada pela jovem Cathryn Harrison, numa manobra do
roteiro que alterna o nome das atrizes e personagens que vivem os dois únicos
papéis femininos; a encenação metódica contrapõe os atores –e o conceito de
seus personagens –o tempo todo; espelhos, vidros, superfícies refratárias e até
mesmo o campo e contracampo do filme interferem a todo momento na percepção
lúcida da personagem.
E esses reflexos –nos mais diversos níveis e
sentidos –serão fundamentais até mesmo no inesperado e potencialmente irônico
final.
Quase um filme de terror, mas muitas vezes um
drama perspicaz sobre as armadilhas da mente, e acima de tudo um trabalho
incategorizável, este filme carrega uma característica bastante singular se
comparado à outras obras de Altman: Sua execução se ampara na perícia de outros
colaboradores técnicos –aos quais Altman não costuma dar espaço –em especial, à
trilha sonora pontual e minimalista de John Williams e à fotografia de Vilmos Zsigmond.
Na filmografia de Robert
Altman, “Imagens” encontra paralelo somente no igualmente enigmático
perturbador e autoral “Três Mulheres”, onde o diretor também exercita uma
notável capacidade –pouco explorada em seus demais filmes, infelizmente –em usar
as ferramentas narrativas do cinema para gerar a desconfortável sensação de uma
dúvida insolúvel.
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