O humor ponderado com o qual os chineses
elaboram suas construções narrativas é um aliado e tanto neste filme a um só
tempo frenético, perspicaz, exagero, melindroso e por vezes espetacular.
Andy Lau, um ator bastante popular na China,
empresta uma ironia característica dos detetives do noir americano, para moldar
o protagonista incomum deste épico, um homem desacreditado politicamente,
desiludido em termos morais a ponto de quase se tornar cínico, mas confrontado
com uma missão (solucionar o mistério, já constituído por forte clamor popular
sobrenatural, que envolve as mortes por inexplicável combustão espontânea de
dois funcionários do império chinês) que poderá fazê-lo chocar-se contra todos
os seus antigos ideais novamente, e talvez até redimi-los, no final de contas.
Às vésperas de ser entregue uma monumental estátua
de Buda (palco desses acontecimentos e de suas investigações), o chamado
Detetive D tem pouco tempo para elucidar o mistério e –como toca a este
inusitado Sherlock Holmes da China Antiga –muitas circunstâncias e personagens
ambíguos a atrapalhá-lo: Wan’ Er, interpretada pela belíssima Li Binging, é uma
agente do império, cuja devoção pela imperatriz (a primeira da China de seus
conspiradores não intervirem) pode convertê-la de uma aliada confiável a uma
traidora mortal a qualquer instante; Donglai interpretado por Gend Chao, é um
oficial invejoso cuja injúria pelos avanços de D, em suas investigações perdem,
por uma margem muito pequena, para sua curiosidade em descobrir o culpado.
Como se isso não bastasse, o próprio D
equilibra-se numa linha muito tênue entre o compromisso fortuito para com a
imperatriz (sendo mais coagido a valer-se de seus conhecimentos para o caso, do
que inspirado à solucioná-lo), e o flerte constante de seus dúbios opositores –também
eles, personagens nem um pouco dignos de confiança.
O tarimbado diretor de filmes de ação Tsui Hark
–mais mundano e menos operístico do que John Woo, para efeitos de comparação –cujo
trabalho mais cultuado talvez seja o norte-americano “Tiro Certo”, com Mark
Walhberg, conduz este majestoso épico de artes marciais, com seu ritmo
tipicamente acelerado, e um desigual senso visual, que atribui uma artificial
atmosfera de irrealidade e lenda, compartilhando muita empolgação por esta
mistura incomum e intrigante de gêneros –aventura, superprodução de época,
suspense, film noir e fantasia.
Para o público ocidental,
pode ser um entretenimento cheio de ressalvas, uma vez que nem todas as suas
facetas se encaixam harmoniosamente, mas há que se notar o fôlego artístico com
que artesãos como Tsui Hark concebem seus trabalhos.
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