terça-feira, 17 de abril de 2018

Enrolados

Dos poucos contos de fadas clássicos –talvez, o único! –ainda não adaptado nas festejadas animações dos Estúdios Disney, “Rapunzel”, ao ver chegada sua vez, veio num período de tal transição para o estúdio que o resultado final, este “Enrolados” –que sequer se vale do título original do conto –acabou sendo completamente diferente das animações anteriores protagonizadas por outras princesas, como “Branca de Neve e Os Sete Anões”, “Cinderella”, “A Bela Adormecida”, “A Pequena Sereia” e “A Bela e A Fera”.
Em meados de 2010, a Disney já havia percebido que a animação tradicional estava fadada a ser substituída irreversivelmente pela computação gráfica: Prova disso foi o fracasso de bilheteria de “Nem Que A Vaca Tussa”, em 2005, e a recepção morna de “A Princesa e O Sapo”, em 2009 –entre os dois, note bem, nem um único longa-metragem animado lançado nos cinemas!
A estratégia da Disney –cujo departamento de animação passou a ser chefiado por John Lasseter, o presidente da Pixar –foi abraçar seu legado (as histórias de princesas e a atualização dos contos de fadas), mas com um olhar voltado ao futuro; combinação que fez de “Enrolados” a primeira animação da Disney, nos mesmos moldes tradicionais de suas obras aclamadas, concebida inteiramente em CG; caminho este que levou, em 2013, à consagração junto ao público e à crítica, de “Frozen-Uma Aventura Congelante”.
Era inicialmente estranho ver o traço que mostrou Branca de Neve ou Ariel ganhar o realismo mais táctil da computação, porém os realizadores compreenderam que este era um caminho inevitável.
Uma flor mágica salva a vida de uma rainha e do bebê que ela esperava, a pequena princesa Rapunzel, e suas curativas propriedades mágicas acabam transferidas para o cabelo da criança, que por sua vez é raptada por uma velha bruxa.
Deixada numa torre alta pela bruxa, para que esta pudesse usufruir a magia para permanecer jovem e bela para sempre, Rapunzel se torna, dezoito anos depois, uma moça de cabelos quilométricos.
Embora acredite que a bruxa (autoritária e prepotente) seja sua mãe, Rapunzel, como toda jovem, está ansiosa para descobrir o mundo além da torre, apesar das contundentes tentativas de sua tutora em reprimir-lhe tais anseios.
Mas, algo dentro de Rapunzel diz que as lanternas que se acendem toda noite no dia de seu aniversário querem dizer-lhe alguma coisa (é, na verdade, uma tradição instituída por seu pai e sua mãe, que nunca perderam as esperanças de encontrá-la), e decide que já é a hora de conhecer o mundo. No que pode ser auxiliada pela aparição de Flynn, um ladrão com encrencas até o pescoço e malandro sedutor, que por acaso acaba escondendo-se dos guardas na torre em que Rapunzel viveu toda a vida.
Plenamente dispostos a manter seu estilo na animação nesses novos tempos digitais, os estúdios Disney recriam o clássico conto de fadas de “Rapunzel” com doses generosas de humor, os habituais números musicais, ora estridentes, ora emocionantes, e elementos que refletem seu próprio tempo, para o bem e para o mal (fruto dos ensinamentos de Lasseter, o roteiro é visivelmente mais elaborado e nada simplista com relação à construção de seus personagens; e, numa cena específica –o fim, quando as lágrimas de Rapunzel restauram a integridade física dos ferimentos de seu príncipe –podemos ver a tendência da Disney em suavizar os elementos mais atrozes dos contos originais).
Esse esforço pode não ajudar “Enrolados” a obter a mesma profundidade e refinamento dos elogiados longas animados da Pixar, mas ainda assim ele certamente está entre seus melhores trabalhos em animação dos últimos anos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário