segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Um Estado de Liberdade


Decidido da voltar à narrativas adultas depois de comandar o sucesso juvenil “Jogos Vorazes” –e fazer o possível para desvencilhar-se de sua continuação... –o diretor Gary Ross abraçou esta trama histórica real que guarda elementos impressionantes.
Entre 1862 e 1863, o soldado confederado Newton Knight (o ótimo Matthew McConaughey) luta, como todos os demais à duras penas, a Guerra Civil Norte-Americana pelo lado do sul.
Uma contundente tragédia em campo de batalha o leva a voltar para o Condade de Jones como desertor, mas lá as coisas não são menos exasperadas: Milícias de soldados da retaguarda –e um tanto interessados em não precisar ir à combate –valem-se de uma lei sulista que exige um contribuição de 10% em alimentos e provisões de todas famílias da região. Entretanto, os militares distorcem essa lei deixando as famílias (que, no geral, não dispunham da proteção do patriarca, enviado em combate) apenas com esse 10% e quase sempre largadas à pobreza e à fome.
Assumindo para si a responsabilidade do bem-estar daquelas famílias, Knight confronta os militares confederados –com espinguarda em punho, no melhor estilo faroeste, o quê em parte este filme busca ser –e se torna um fugitivo fora-da-lei, sendo obrigado a buscar refúgio nos pântanos caldalosos da Louisiania. Lá, junta-se à outros fugitivos: Negros, ex-escravos, tentando escapar de seus algozes, entre os quais o articulado Moses (Mahershala Ali).
Contando com a ajuda ocasional da escrava doméstica Rachel (a fantástica Gugu Mbatha-Raw) –que, após a partida da própria esposa de Knight (Keri Russel), pouco a pouco inicia um envolvimento com ele –o grupo aos poucos aceita a liderança de Knight e, valendo-se de seu quase inacessível esconderijo no pântano, promove sucessivos ataques às caravanas confederadas.
Conforme os meses e anos avançam, tornando mais periclitante a circunstância da guerra, hordas de desertores (inclusive brancos) unem-se ao grupo de Knight chegando à casa das centenas. Em um detemrinado momento são tão numerosos que acabam tomando o Condado de Jones do exército e assumem o controle da região.
Pelo menos até o fim da Guerra Civil o quê leva o Exército da União a fazer uma varredura com mil soldados no local.
Knight e seus subordinados, porém, já se decidiram a partir; ele especificamente foi com Rachel para o território de Soso onde tornou-se fazendeiro –e a condução de Gary Ross aproveita para intercalar essa história principal com breves lances de outra, ocorrido oitenta e cinco anos depois, em meados da década de 1940, quando um descendente de Knight é julgado num tribunal por infração das leis de segregação (segundo as quais, um descendente de negros –o quê está em julgamento que ele pode ou não ser –não pode se casar com uma mulher branca).
Unindo aspectos de filme de guerra, faroeste e drama histórico (o último mais predominante que os dois primeiros), o diretor Gary Ross enfatiza sobretudo o pioneirismo de ideais embutido nas ações protagonizadas por Knight que à sua maneira lutou por igualdade e liberdade até o fim da vida; e tão fulgurante foi sua intenção, ele tenta falar, através da trama paralela com seu descendente, que até mesmo décadas depois seus familiares sucessores tiveram de fazê-lo.
O filme, munido desse nobre objetivo, consegue ser instigante sem ser necessariamente brilhante: McConaughey, Gugu Mbatha-Raw e Mahershala Ali são magníficos em suas composições sólidas. A própria direção de Ross domina o ritmo e o tom com firmeza eloquente, todavia, a trama que ele tece ao longo do filme se desenlaça por meios sombrios e introspectivos parecendo, ao final, desvanecer ao invés de simplesmente acabar.
Como se o filme seguisse de desilusão em desilusão, de injustiça em injustiça, na intenção de alertar e incomodar o expectador, sem no entanto ter uma clara noção de seu desfecho.

Nenhum comentário:

Postar um comentário