Nos anos 1980, o diretor e roteirista Lawrence Kasdan passeou pelos mais diversos gêneros a fim de saciar sua ‘fome’ por cinema. Certamente, entre as opções, não poderia faltar o faroeste, algo que ele realizou em 1985, após “Corpos Ardentes” e “O Reencontro”, concebendo “Silverado”. A visão do gênero partilhada por Kasdan e por seu irmão Mark (colaborador dele no roteiro), contudo, não tinha quaisquer reflexos das ramificações do faroeste de então –os spaghetti, feitos na Europa ou os revisionistas, feitos nos EUA mesmo –na verdade, sua visão não tinha sequer as questões e considerações subliminares das obras de John Ford e Howard Hawks: O moleque ávido e entusiasmado por faroeste que Kasdan foi um dia fomentou nele uma necessidade de realizar um filme norteado tão somente por seu senso de aventura. E essa decisão permeia e define “Silverado” do início ao fim.
A primeira cena, habilidosa nos quesitos
técnicos dispostos pela produção, mostra Emmett, o protagonista de Scott Glenn,
num barraco escuro e fechado, a trocar tiros com inimigos escondidos do lado de
fora. Encerrada a breve cena –com a morte de seus oponentes –Emmett sai porta
afora, seguido pela câmera em movimento, num take que remete deliberadamente à clássica introdução de “Rastros de Ódio”.
E está então estabelecido tudo o que o filme de
Kasdan vai ser (e o que não vai ser): Um faroeste de tintas tão românticas
quanto heróicas, imbuído do clima de matinê dos faroestes de antigamente –antes
que o gênero ganhasse elementos existenciais, e profundas análises de cunho
histórico ou até metalinguístico. Assim, na sequência, Emmett cruza-se com o
outro protagonista do filme (tão ou até mais importante que ele), Paden,
personagem vivido pelo sempre carismático Kevin Kline. Ele surge só de ceroulas
largado no deserto e, ao receber auxílio de Emmett, logo estabelecem a parceria
que haverá de perdurar por todo o filme.
Emmett vai até a cidadezinha de Turley, onde
encontra o irmão caçula, Jake (Kevin Costner, num personagem mais descontraído
do que de costume) em apuros com as autoridades locais. Escapando por um triz
do xerife (vivido por John Cleese), graças à ajuda do pistoleiro negro Mal
Johnson (Danny Glover), os quatro decidem rumar para a cidade de Silverado,
onde mora da irmã de Emmett e Jake, e para onde ele pretende ir, uma vez que
saiu há pouco da cadeia onde esteve por cinco anos.
Entretanto, nesse caminho, complicações usuais
do faroeste os perseguem: Eles resolvem auxiliar uma caravana com o mesmo
destino deles –em meio à qual se encontra a personagem sub-aproveitada da bela
Rosanna Arquette –cujos ocupantes tiveram seu dinheiro roubado. No decurso de
inúmeras idas e vindas, todos chegam em Silverado, somente para descobrir os
verdadeiros problemas que lá os esperam; e que são essenciais ao plot: Para Emmett e Jake, o filho do
homem que Emmett matou (morte pela qual pagou com a prisão), tem um plano de
vingança pronto para ser posto em prática; para Mal, cujo o pai, Ezra (Joe
Seneca) passa poucas e boas para sustentar a terra da família, e a irmã Rae
(Lynn Whitfield) tem de prostituir-se no saloon local, estão reservados os
mesmos perigosos aborrecimentos que alguém tentando enfrentar a discriminação e
a injustiça deve encarar; e para Paden, cujo xerife local, o desonesto Cobb
(Brian Dennehy) coloca sob suas asas assim que chega a Silverado, resta um
difícil dilema: Ajudar os novos amigos, indo contra um homem que a ele se
aliou, ou omitir-se de todas as terríveis ciladas para eles preparadas.
A resposta para isso não é nenhuma surpresa: A
força de “Silverado” não está na subversão de narrativas clássicas desse
gênero, mas no reencontro ávido e apaixonado com esses expedientes, no clima
épico imediatamente reconhecível de quando tais momentos estão se aproximando
e, nesse sentido, “Silverado” não deseja, em momento algum decepcionar seu
público –aquele tipo de expectador que almeja encontrar um faroeste
descomplicado, onde mocinhos e bandidos são definidos com características
absolutamente reconhecíveis, e seus empates –ilustrados com pompa e circunstância
dramática –seguem os rituais de praxe que emolduram grandes momentos da Velha
Hollywood.
Em sua evoção do que o gênero tem de mais
clássico, “Silverado” não deixa de encontrar pequenos lapsos que se fazem mais
evidentes conforme o tempo foi passando. Seu maior defeito é a tremenda falta
de profundidade em relação aos enredos individuais de cada personagem, um
problema bastante razoável para um filme que se divide entre tantos
protagonistas e almeja dar uma sub-trama a cada um.
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