quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Teoria da Conspiração


 O cinema comercial –em especial, o hollywoodiano –sempre valeu-se do ostensivo apelo de público no qual eram reunidas duas (ou mais) grandes estrelas em cena; em torno disso girou a própria premissa do sucesso “Onze Homens e Um Segredo”, por exemplo. A despeito da qualidade –alguns filmes tinham muita, outros não tinham nenhuma... –esse era um recurso que parecia funcionar muito bem e instigava a curiosidade dos expectadores. E por volta da década de 1990, não haviam estrelas tão reluzentes quanto Mel Gibson e Julia Roberts, e foram justamente os dois quem o diretor Richard Donner reuniu no interessante, envolvente e descontraído “Teoria da Conspiração”.

Na época, o diretor Donner e o astro Mel Gibson estavam aproveitando ao máximo uma sintonia rara descoberta em pleno set de filmagens: Donner não apenas havia dirigido, com largo êxito, Gibson na série “Máquina Mortífera” –naquele ano, 1997, os três primeiros filmes já haviam sido feitos, e o quarto seria lançado no ano seguinte –como também dirigiu Gibson no faroeste “Maverick”. Na sua colaboração, portanto, Donner sabia precisamente o que poderia extrair das capacidades de Gibson e disso se vale para construir a trama engenhosa deste filme.

Flertando até que um bocado com a comédia –na qual Gibson se sai muito bem na sua dosagem de tiques nervosos –o roteiro de Brian Helgeland (roteirista de “Los Angeles-Cidade Proibida” cujo apreço sempre foram tramas intrincadas) apresenta o paranóico e catatônico personagem Jerry Fletcher, vivido por Mel Gibson. Fletcher é um motorista de táxi de Nova York, no entanto, essa ocupação não chega exatamente à defini-lo; seu objetivo, como taxista, parece ser mais o de passar despercebido às autoridades governamentais que, em seu íntimo, ele crê conspirarem o tempo todo contra o cidadão comum a fim de estabelecer um controle sempre maior sobre o mundo. Para tanto, Fletcher tem uma rotina regida pelos mais extremos pormenores do transtorno obsessivo-compulsivo (trancas e fechaduras, por exemplo, são uma eterna fonte de dúvida), publica clandestinamente um jornal subversivo destinado à apontar as mais improváveis conspirações praticadas pelo governo (o “Conspiracy Theory”) e atazana a vida da advogada do Departamento de Justiça dos EUA Alice Sutton (Julia Roberts) que, solícita, até dá um pouco de corda às suas sandices.

Entretanto, numa noite, Jerry é capturado por homens misteriosos liderados pelo obscuro Dr. Jonas (Patrick Stewart, sensacional numa quase recriação do personagem de Laurence Olivier em “Maratona da Morte”). O motivo, ainda que nebuloso, não tarda a se esclarecer: Em algum momento, dentre tantas teorias aleatórias veiculadas em seu jornalzinho clandestino, Fletcher acertou uma delas em cheio, o problema é, qual delas? Tentando escapar dos homens perigosos e treinados que agora o perseguem (em uma cena, numa divertida brincadeira do diretor Donner, Gibson refugia-se num cinema que exibe “O Feitiço de Áquila”, um de seus clássicos dos anos 1980), Fletcher acaba envolvente a sensata Dra. Sutton em suas enrascadas e, nesse percurso tortuoso, descobre que havia sido, ele próprio, vítima de uma espécie de lavagem cerebral previamente realizada; o que em parte explica seu comportamento paranóico e cheio de T.O.C. além de sua obsessão inexplicável pelo livro “O Apanhador No Campo de Centeio”.

Frenético, dono de um ritmo que somente um mestre da ação e da aventura escapista como Richard Donner seria capaz de imprimir na tela, “Teoria da Conspiração” surpreende o público, sobretudo, pela imprevista complexidade do seu enredo que, para as pretensões modestas de seu projeto, se torna até desafiador e rocambolesco em demasia a partir de certo ponto. O encontro em cena entre Julia Roberts e Mel Gibson pode não suscitar tantos suspiros quanto o público interessado exclusivamente nisso gostaria –até porque o filme não é e nem quer ser um romance –mas, ele oferece diversão, ação, mistério e enigmas intrigantes em profusão, para uma agradável sessão de passatempo noventista; e um casal central que não deixa de exibir química e carisma em níveis admiráveis.

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