sábado, 11 de outubro de 2025

O Ônibus Perdido


 Sempre ávido por tramas extraidas da realidade, o diretor Paul Greengrass moldou ao longo dos anos um cinema feito de urgência, de um estilo muito característico e de uma atenção voltada aos esforços do homem comum diante de circunstâncias gigantescas que o oprimem, sejam elas de ordem política (“Domingo Sangrento”), existencial (“Voo United 93”), sociológica (“Capitão Phillips”) ou de ordem física, como neste caso aqui.

“O Ônibus Perdido” é baseado no caso do Incêndio Camp Fire, ocorrido no verão de 2018, registrado como o maior incêndio florestal da história.

Seu protagonista é Kevin McKay (Matthew McCounaghey) um motorista de ônibus escolar na cidade de Paradise, no condado de Butte, no norte da Califórnia, cujas complicações da vida familiar (o divórcio com a ex-esposa, o falecimento recente do pai, a relação com o filho, ressentida pelo distanciamento) começam a comprometer sua vida profissional: Os problemas com o filho adolescente e com a mãe adoentada (ambos interpretados pelo filho e pela mãe de Matthew na vida real) o impedem de honrar os horários de trabalho, o que esgota a paciência de sua supervisora e chefe (Ashlie Atkinson, de “Margot e O Casamento”).

No dia 8 de novembro de 2018, uma falha nas torres de energia da região de Feather River Canyon provoca uma série de faíscas que, devido aos ventos fortes, logo originam um foco de incêndio. Embora denunciado pelos motoristas da auto-estrada ao corpo de bombeiros da região, o foco de incêndio acaba não sendo controlado, em parte por que o acesso aos declives se mostra desafiador aos bombeiros, em parte porque o próprio vento se encarrega da propagação.

Quando as chamas começam a revelar colunas imensuráveis de fumaça, os chefes das brigadas de incêndio, mesmo munidos de alta tecnologia e cobertura via satélite, inicialmente presumem ser mais do que apenas um incêndio. É o Capitão Martinez (Yul Vazquez), Chefe da Divisão de Bombeiros da Califórnia, que logo se dá conta de que trata-se de um único e gigantesco incêndio. Não apenas gigantesco, mas potencializado por uma extrema facilidade de propagação.

Os fortes ventos não demoram a levar o fogo para a cidade de Concow, ameaçando seriamente sua população, depois dela, Magalia e, sem seguida, Paradise.

Quando por fim os alertas de evacuação são emitidos (um tanto quanto tarde demais), o incêndio alastrou-se de forma tão rápida que os meios de comunicação municipais de Paradise já haviam sido comprometidos –instituições, como as escolas, foram avisadas por meios indiretos, e as pessoas foram instruídas a seguirem para abrigos, afastando-se da Área Leste, a região de maior risco. Entretanto, um grupo de 23 crianças é deixado para trás. Quando é requisitado, via rádio PX, um ônibus que estivesse disponível nas imediações da Área Leste para resgatar as crianças (todos os demais ônibus, notificados, já haviam partido com suas crianças para os abrigos), o único disponível no local é o de Kevin –ele havia se atrasado para levar o veículo à manutenção devido à um problema de febre do filho. Designado para ir buscar as crianças acompanhadas da Prof. Mary Ludwig (America Ferrera, de “Barbie”), Kevin deve correr contra o tempo e contra o perigo para atravessar toda a caótica Área Leste –convertida num verdadeiro inferno devido à debandada em desespero da população, às chamas que já começavam a consumir tudo e à fumaça espessa e densa que converteu o dia em noite (na primeira das inúmeras cenas impressionantes que o filme entrega) –e trazer as crianças de volta para seus pais aflitos.

É um cinema humanista este que Paul Greengrass realiza. Sem arroubos, sem sentimentalismo ou panfletagem, ele concebe uma obra na qual seu impacto (seja a tensão avassaladora das cenas, seja a emoção insuspeita em seu ápice) provem tão somente da objetividade na história que busca contar –uma história sobre o empenho cristalino do homem comum em sobreviver mesmo que diante de forças implacáveis da natureza.

Nenhum comentário:

Postar um comentário