quinta-feira, 28 de abril de 2016

O Marido da Cabeleireira

Uma das mais gratificantes experiências no terreno do cinema francês da década de 1990, o filme de Patrice Leconte acompanha os olhos pasmos e encantados de um garotinho na descoberta de seu desejo pelas mulheres: E o objeto desse desejo acaba sendo sua opulenta cabeleireira semanal.
À exemplo do posterior “Malena” (de Giuseppe Tornatore), a narrativa se beneficia de um ponto de vista subjetivo para encher de lirismo as percepções de infância que remetem à trama, todas com atmosfera da mais encantadora lembrança, e Leconte se embriaga ao dirigir essas cenas, compartilhando uma insuspeita grandeza de espírito com o expectador e vislumbrando prazer onde outra enxergariam só banalidade.
Ao contrário de “Malena”, contudo, o filme de Leconte não se detém aí: Ele mostra que esse fascínio nutrido pelo protagonista (um brilhante Jean Rochefort) por sua cabeleireira é um fator que definiu o homem adulto que ele veio a se tornar.
A mulher de sua vida, portanto, apresentou-se para ele, mais tarde, nessas mesmas condições: Uma jovem cabeleireira, para quem ele não tarda a expressar suas intenções.
“A resistência...” dizia-lhe seu pai quando garoto “...torna a rendição mais doce!”
Ele casa-se com ela, realizando o sonho romântico que tinha desde moleque, mas isso são apenas detalhes na trajetória do amor narrada com objetividade poética por Patrice Leconte, neste filme especialmente econômico, enxuto e sem firulas, onde a beleza é capturada pela autenticidade com que a história nos é contada.
Verdade que os objetivos de Leconte não devem ter sido atingidos por inteiro na produção, embora ele consiga disfarçar isso maravilhosamente bem ao lançar mão das presenças extraordinárias de Jean Rochefort, cujos olhares em cena dizem tudo que há necessidade para dizer, e da linda Anna Galiena tão apaixonante para o encantado protagonista quanto é para nós mesmos.
Afinal, Leconte ratifica o fato (um tanto quanto romantizado e idealizado) de que a vida, e muito do que nela fazemos, é justificado por uma mulher que surge para nos completar. E Anna Galiena dá à essa mulher formas e expressões tão deslumbrantes que durante os rapidíssimos oitenta e dois minutos de filme não somos capazes de duvidar dele.

O final, no qual os homens, na ausência dela, ficam em silêncio e expectativa, é lindo, emocionante e contemplativo, como volta e meia o cinema consegue fazer.

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