É assim que tomamos conhecimento de tudo;
através dos olhos do recém-chegado Thomas (Dylan O’ Brien). Como todos os quase
cinqüenta garotos que vieram antes dele, Thomas teve suas lembranças apagadas
(de inicio, sequer lembra o próprio nome) e seu estado ao emergir dentro do
misterioso elevador de carga na Clareira é de perplexidade.
A Clareira vem a ser um campo com floresta
localizado no centro de um gigantesco labirinto e dele separado por imensas
muralhas de pedra. Toda manhã as portas da muralha se abrem. Toda noite, elas
se fecham. Ou seja: Os jovens que sobrevivem lá dentro têm todo o dia para
tentar encontrar uma saída (o quê, nos três anos em que lembram de estar lá,
jamais o conseguiram). À noite, eles sabem, não é prudente estar no labirinto:
Criaturas perigosas (e monstruosas), apelidadas “verdugos”, rondam àquele lugar
a partir do momento em que as portas se fecham.
É nessa condição imutável –e toda ela
proveniente do conceito de William Golding para “O Senhor das Moscas” –que
surgiu uma espécie de sociedade composta por esses garotos perdidos, e que o
protagonista Thomas vai, aos poucos, compreender em “Maze Runner-Correr Ou
Morrer”.
Os jovens criaram inúmeras regras para
conviverem entre si. A mais importante delas: Todos estão terminantemente
proibidos de entrar no labirinto. Os únicos autorizados para tanto são os “corredores”,
selecionados entre os garotos mais rápidos.
Assim que chega, o novato que surge todo o mês
é avaliado e incluído em algum dos grupos: Os “corredores”; os “socorristas”
(que zelam pela saúde de todos); ou os “construtores” (responsáveis pelas plantações
que alimentam a todos e pelas estruturas da Clareira).
Um conjunto de regras que funciona apesar da
relativa curiosidade indomável que Thomas demonstra desde que chegou, isso pelo
menos até a chegada da primeira garota a surgir no labirinto, a enigmática
Teresa (Kaya Scodelario), cuja presença vem acompanhada de uma série de
mudanças que colocarão tudo a perder.
Tem-se então uma premissa na qual estão
expostos e avaliados muitos das inclinações humanas referentes aos anseios
primitivos do homem: Fascinante, por exemplo, o caso do personagem Gali (Will
Poulter), que imediatamente hostiliza Thomas e seu intuito impetuoso de sair do
labirinto e levar a todos consigo; para Gali, o labirinto não é uma prisão, mas
o seu lar, todo o mundo que ele conhece e no qual se sente à vontade, e ele
está pronto para neutralizar qualquer elemento que busque tirá-lo dessa sua
zona de conforto.
Quando ficam claros os passos largos e
frutíferos que Thomas está dando na direção de finalmente deixarem o labirinto
(e descobrirem a razão de terem sido lá deixados), a reação de Gali é uma
desesperada indignação, um ultraje perante aquele invasor que se atreveu a
tentar alterar um ciclo equilibrado que para ele funcionava com harmonia, e no
qual não enxergava razão para abandonar.
Em meio à aventura, necessariamente carregada
de tensão e empolgação, que se segue, várias outras questões de ressonância
moral e social vão surgir.
Austero e atento às entrelinhas, o diretor Wes
Ball soube ressaltar essas e muitas outras variações reflexivas embutidas na
trama, preservando a verve filosófica que o romance de James Dashner parecia
extrair do clássico de Golding e impondo um ritmo preciso e alucinante,
construindo uma das melhores sagas juvenis dos últimos tempos. Qualidade que se
mantêm mesmo comparando-o à “Harry Potter” e “Jogos Vorazes”, provavelmente os
melhores produtos desse sub-gênero.
Uma pena que a personagem Teresa, da forma como
está, oferece poucas oportunidades para a bela Kaya Scodelario brilhar: Muito
pouco sabemos dela durante a maior parte do tempo, e ela própria opta pelo
silêncio ao invés de expressar o que sente ou pensa. E isso não muda muito no
filme seguinte. Por falar nele...
No segundo filme, “Maze Runner-A Prova de Fogo”
acompanhamos os personagens a partir do ponto em que o primeiro filme os
deixou: O mundo do lado de fora do labirinto não é tão seguro e tranqüilo
quanto imaginavam.
Ao que parece, um vírus capaz de transformar
pessoas em zumbis dizimou grande parte da humanidade e Thomas e seu grupo, por
se encontrarem numa espécie de laboratório de testes (era algo assim que o
labirinto era...), são cobaias em potencial para a elaboração de uma cura.
Nessas condições, eles fogem do refúgio que
lhes prometia abrigo, mas que no final das contas era só mais uma prisão, e
ganham as extensões arenosas do deserto, à procura do misterioso grupo armado
denominado “Braço Direito”.
Novos personagens surgem para tornar mais
nebulosa e ambígua a definição de heróis e vilões da trama. A explicação da
existência do lúdico labirinto do primeiro filme mostra-se cheia de meandros
complexos que aproximam “Maze Runner” do terreno da ficção científica
distópica. O direto Wes Ball continua prodigioso e não permite que a brutal
alteração de cenário e atmosfera em relação ao primeiro filme afete seu
trabalho, entregando uma obra pulsante, ágil e enérgica, que não perde o fôlego
nem mesmo quando sua duração excessiva ameaça pesar sobre a narrativa no ato
final.
O gancho final de “A Prova de Fogo” deixa tudo
em aberto –no melhor estilo “Império Contra-Ataca” –para o episódio final, “A
Cura Mortal”, e aí temos o curioso e inusitado fato que pode tornar “Maze
Runner” uma saga singular no cinema comercial: Durante as filmagens do terceiro
filme, um acidente tirou da ação o protagonista Dylan O’ Brien, isso e mais a
inesperada gravidez de Kaya Scodelario levaram os estúdios da Fox a adiarem
indefinidamente as filmagens de “A Cura Mortal” (que se achavam na metade).
Ninguém sabe se o estúdio tem planos de retomar
a realização do projeto, o que demandaria ainda mais custos em seu orçamento e
acarretaria uma logística complicada para reunir todo o elenco e a equipe
técnica novamente.
Se a Fox optar pelo caminho
mais fácil, e desistir do projeto depois que O’ Brien se recuperar, então “Maze
Runner” entrará para a história como uma série sensacional e empolgante cujos
fãs jamais tiveram a chance de ver como terminava.
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