A carga emocional que a narrativa de Louis
Malle consegue embutir em seu trabalho mais auto-biográfico é das mais
poderosas, em grande parte, porque ela diz respeito à um profundo sentimento de
culpa e auto-recriminação pelos acontecimentos registrados.
Em razão disso, Malle faz com que cada quadro seja de uma beleza tão esmagadoramente triste quanto cruel, talvez, numa analogia impiedosa do ressentimento que reserva a si próprio.
Suas últimas palavras, as que encerram o filme, são de partir o coração:
"Mais de quarenta anos se passaram, mas lembrarei de cada segundo daquela manhã de janeiro, até o dia da minha morte!"
Mas vamos começar pelo começo: É a segunda metade da década de 1930, e a
ocupação alemã tem sutil início na França e em toda Europa. Mais sutil ainda é
a percepção desse novo e aterrador status do ponto de vista dos jovens alunos
da escola francesa só para meninos que serve de cenário para todo o filme.
Julien, o protagonista do filme e alter-ego de
Malle, é um jovem que se equilibra bem entre os meninos mais populares da
escola e os garotos que sofrem com a rejeição e o desprezo. Ele não deixa de
ostentar ocasionalmente aquele ar blasé tão tipicamente francês e igualmente
típico dos protagonistas de Louis Malle, mas a escola onde vive prima por sua
instrução católica de tolerância e compaixão, e esses ensinamentos não farão
sentido se Julien não exercê-los, e é aí que entra Jean Bonnet, o garoto
inicialmente misterioso surgido por acaso em meio aos alunos, aparentemente sob
ao cuidados do padre reitor.
Em princípio rejeitado, como naturalmente
ocorre à todo forasteiro numa circunstância assim, Jean estabelece com Julien
uma amizade que começa relutante, mas vai ganhando força à medida que os
meninos se dão conta de sua compatibilidade.
Mas logo, o mundo fora dos muros da escola
sinalizará, com a chegada do mais nefasto dos acontecimentos, a Segunda Guerra
Mundial, arremessando a vida daqueles jovens num turbilhão de irreversível
perigo, e legando à memória do jovem Julien uma série de instantes que ele
passará o resto da vida tentando expiar.
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