quinta-feira, 10 de novembro de 2016

A Montanha Dos Canibais

Uma das correntes de cinema a experimentar mais altos e baixos em todo o mundo certamente foi o cinema italiano; uma potência cinematográfica nas décadas de 1950 e 60, a Itália viu muito de sua abundância criativa de escassear na década seguinte, quando uma série de novas tendências de mercado (como o exploitation) nivelou por baixo sua produção cinematográfica.
Foi uma convergência de inúmeros fatores desfavoráveis: Além de seus artesãos proeminentes serem contratados continuamente por Hollywood (e para lá transferidos), os anos 1970 vinham com uma carga de subversão –herança da contracultura dos anos 1960 –que se refletia no teor mais pesado dos filmes daquele período (fenômeno que ocorreu, diga-se, no mundo todo).
Esses fatores somados (a baixa qualidade da mão de obra do mercado, o despontar da exploitation e a característica mais mundana dos realizadores de então) propiciaram o surgimento de um sub-gênero chamado “ciclo canibal”, que não era tão diferente da pornochanchada aqui no Brasil.
Basicamente eram trabalhos que se prestavam ao baixo orçamento de praxe (ambientação na selva, sem a necessidade de maiores cuidados) e seguiam uma mesma fórmula: Personagens perdidos por alguma razão qualquer se deparam com uma tribo canibal, e são trucidados, com requintes de crueldade, um a um, e não raro, em circunstâncias que até se repetiam em um e outro filme (!).
O registro, para fins comerciais, era sensacionalista: Muito sangue, muita violência, em níveis quase intoleráveis, e ocasionalmente, nudez gratuita.
O maior, vamos dizer, ‘clássico’ desse nicho é o terrivelmente perturbador e infame “Holocausto Canibal”, de Ruggero Deodato, mas muitos filmes foram realizados a toque de caixa por caras como Umberto Lenzi, Alain Deruelle, Joe D’ Amato, Sergio Martino e até Jess Franco (embora este repudiasse o sub-gênero canibal...).
É, por sinal, Sergio Martino o diretor de “A Montanha dos Canibais” que consta em meio ao sub-gênero, como uma de suas obras mais competentes e desiguais –embora, no que se refere ao “ciclo canibal” isso não queira dizer muito...
O elenco, com astros de certo porte (como Ursula Andress e Stacy Keach), também é um fator curioso –todos, verdade seja dita, só estão no projeto porque suas carreiras atravessavam um período de vacas magras, relegando-os a trabalhos mais obscuros.
Mas, Ursula Andress ainda era uma mulher belíssima, e isso é parte do fetiche em colocá-la como uma esposa empenhada em encontrar o paradeiro do marido, desaparecido em uma expedição por florestas inexploradas (e o mistério de seu desaparecimento é algo que, desde já, qualquer um deduz a resposta).
Quando os aguardados canibais surgem (o objetivo compulsório do gênero, afinal) vem junto com eles todas as cenas escabrosas de morte e mutilação que os fãs ansiavam, em contraponto à elas (que embora beirem o escatológico, possuem relativa finesse em comparação ao que esse gênero produziu de mais execrável) há também as cenas de nudez de Ursula Andress –em especial, àquela na qual ela tem o corpo todo lambuzado de uma espécie de óleo por duas belas índias –de estranho e até perturbador contraste com toda a nojeira gore que se derrama na tela ao longo da última hora de duração

Resumindo: Eis um exemplar daquele ciclo absolutamente estóico na forma como assume sua vulgaridade.

Um comentário:

  1. Esse subgênero foi uma das características do Cinema de Terror na virada dos anos 70 pros 80. Mas ficou por ali mesmo.

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