terça-feira, 29 de novembro de 2016

Blindman

Há uma ligeira (e compreensível) confusão em relação ao título nacional deste filme: “Preso na Escuridão” é, também, o título nacional de “Abra Los Ojos”, o filme espanhol realizado por Alejandro Amenabar, e que depois seria refilmado por Cameron Crowe, resultando na produção norte-americana “Vanilla Sky”.
Já, este aqui, intitulado “Blindman” no original, trata-se de um dos mais incomuns exemplares do já incomum sub-gênero do faroeste spaghetti.
Para tornar tudo ainda mais inusitado, este filme, à exemplo dos grandes clássicos do segmento, a “Trilogia dos Dólares”, de Sergio Leone (que inspirou-se em “Yojimbo-O Guarda-Costas”, de Akira Kurosawa), parece ser uma espécie de reaproveitamento do mesmo conceito de um cultuado personagem de filmes de samurais: Trata-se de Zatoichi, que tem em Quentin Tarantino um de seus mais ilustres fãs e é um guerreiro cego, recordista em número de aparições nos filmes japoneses. O protagonista deste filme (interpretado por Tony Anthony, também ele produtor) é, em muitos aspectos, uma versão de Zatoichi para o faroeste spaghetti, assim como o personagem de Clint Eastwood nos filmes de Leone era uma versão de Yojimbo.
Tudo começa quando acompanhamos o “blindman” do título –um pistoleiro cego (!), por mais absurda e inexplicável que possa parecer essa idéia –percorrendo os desertos desolados do México para capturar um ex-companheiro que lhe passou a perna e roubou-lhe a comitiva de mulheres (!!) que aparentemente ele tinha a missão de entregar para algum encomendador.
E já nesse entrecho imediato, há uma estranha sensação de que o filme possa ser continuação de uma história anterior, o quê já o aproxima bastante das tramas protagonizadas por Zatoichi –mas, só para constar, não há nenhum outro filme estrelado pelo “blindman” além deste (exceto claro, uma refilmagem não oficial feita nos anos 1990, com Armand Assante, e uma regravação feita a toque de caixa pelo mesmo astro e pelo mesmo diretor, Ferdinando Baldi, dez anos depois).
Prosseguindo o relato, como nosso herói é cego, e não enxerga um palmo à sua frente, suas dificuldades são maiores que de costume, uma vez que ele sempre se cruza com inimigos que abusam sem o menor pudor de sua deficiência –e praticamente inexistem aqueles momentos habituais (mesmo no caso de Zatoichi) em que o cego revela outros dons sobre-humanos.
É assim que, aos trancos e barrancos, o desafortunado “blindman” irá envolver-se numa disputa com as forças opressoras de um vilanesco coronel local –que vem a ser o mesmo que está com as tais mulheres que ele levava (a forma chauvinista e absolutamente misógina com que as mulheres são tratadas, como gado, dá a este filme uma atmosfera tão patética quanto anacrônica).
Diversos elementos tornam a produção um tanto curiosa, tendo ela sido esquecida nos anos 1970, mas redescoberta com o DVD, o quê apenas confirma e justifica seu caráter cult. É realmente uma das obras mais desiguais do gênero, não só pelo inusitado de seu protagonista, mas por outras razões como o fato de lançar mão de constantes cenas de nudez (incomuns em faroestes) e tornar esse detalhe fetichista um dos muitos comentários cheios de ironia cruel e sarcasmo para com seu herói –afinal, ele é o único que não pode desfrutar das dezenas de beldades peladas que desfilam na tela (!).
Outro fator bem curioso é uma ponta do ex-beattle Ringo Starr (a banda havia acabado no ano anterior à realização do filme), arriscando-se como ator num papel pequeno, porém relativamente significativo para a trama como um dos irmãos do grande vilão.

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