quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Matador de Aluguel

De um modo quase geral, os filmes comerciais dos anos 1980 possuíam um tom irreal que os tornava únicos. Isso não se devia tanto pelo fato da inverossimilhança de suas cenas de ação (realizadas, em geral, com uma economia e uma precariedade de recursos que hoje soam truncados) mas, por um absurdo inerente às suas histórias e seus personagens, cujo contexto, não raro, resultava em produtos politicamente incorretos.
Haviam ciborgues fascistas (“Robocop”), estudantes de conduta questionável alçados à condição de heróis (“Curtindo A Vida Adoidado”), fantasias com violência e sexo para a família (“Conan-O Bárbaro”), soldados megalomaníacos homicidas (“Rambo”), aventuras aéreas que versavam sobre o egocentrismo e a arrogância (“Top Gun”), sanguinolência destinada ao público adolescente (“Sexta-Feira 13”), malícia e vulgaridade em profusão também para esse mesmo público (“Porky’s-A Casa do Riso e do Amor”), revisões de caráter machista e publicitário do gênero musical (“Flashdance”), policiais brutamontes e sem noção (“Stallone Cobra”) e muitos, muitos outros casos.
Em meio a estes, “Matador de Aluguel” se destaca por uma série de pequenos e curiosos detalhes. Para entendê-los e vislumbrá-los, basta dissecar sua sinopse: Leão de Chácara de aluguel (o versátil Patrick Swayze) é contratado para impor ordem no violento ambiente de uma boate noturna, acometida por toda sorte de desordeiros.
São estranhos os filmes que saíam àquela época. Neste aqui, o “herói” –cuja a alcunha é resumida num gutural e solitário ‘Dalton’, sem sobrenome mesmo... –é um leão de chácara (!), um tipo de capanga remunerado, ou algo assim. Ou seja, por mais que a narrativa enfeite as coisas e atribua todo um caráter de fábula do bem contra o mal (a década de 1980 era pródiga em conceitos que tentavam versar sobre esses paradigmas), não há muito propósito na história, nem um motivo maior para se torcer pelo protagonista que pode ser tão ou mais bandido do que os caras que ele esmurra... mas enfim, os filme de ação dos anos 1980 meio que se beneficiavam dessa aura inusitada que, para muitos, lhes conferia charme.
Cheio de pose, o “herói” acaba sendo levado por inusitadas circunstâncias a tornar-se o único agente capaz de, não apenas moralizar o seu local de trabalho, mas (pasmem!) limpar a criminalidade da região também (o quê inclui bater de frente com o grande vilão da produção, o chefe mafioso interpretado com autoconsciente noção de canastrice e galhofa por Ben Gazzara), e no processo –como é habitual em filmes de ação –traçar a loirona gostosa do pedaço, neste caso em específico, a deliciosa Kelly Lynch, no papel de uma médica (e, como de praxe, com uma cena breve, porém maravilhosa, de nudez).
Feito para o eminente estrelato de Patrick Swayze, que por aquela época fez sucesso com o musical "Dirty Dancing", este “Matador de Aluguel” –cujo título nacional para “Road House” é sensacionalista e mentiroso para com sua trama –tem o mérito de mostrar as notáveis qualidades que o falecido Swayze reunia como astro: Seu físico atlético era capaz de convencer os meninos em filmes de pancadaria como este ou a divertida ficção “Crepúsculo de Aço” e encantar as meninas em produções românticas como o já citado “Dirty Dancing” e “Ghost-Do Outro Lado da Vida”, sem dúvida seu maior sucesso. Em outras palavras, provavelmente o mais completo astro surgido nos anos 1980, mas que estranhamente –talvez, por forças da época alienada à que pertenceu –não emplacou tão bem quanto astros que, ao contrário dele, eram completamente limitados por suas insuficiências dramáticas a um único nicho, como Sylvester Stallone ou Arnold Schwarzenegger.
Antes que me esqueça: Muito bom poder conferir no elenco a boa presença do ótimo Sam Elliot, também ele um grande ator pouco aproveitado no cinema.

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