As influências sempre exerceram efeito
particular nas obras de Danny Boyle de maneira individual: Em sua estréia,
“Cova Rasa”, sua fonte era Alfred Hitchcock, na ficção “Sunshine-Alerta Solar”,
eram as obras de Kubrick (“2001”) e Tarkoviski (“Solaris”), no filme que lhe
deu o Oscar, “Quem Quer Ser Um Milionário?”, eram as produções indianas de
“Bollywood”.
Na época de seu lançamento, 1996, até se
alardeou que uma das influências de Boyle para “Trainspotting” seria “Laranja
Mecânica”, de Kubrick, mas essa é uma afirmação redundante, não apenas pela
considerável diferença entre a proposta desses dois filmes, como também pela
originalidade salutar e a fascinante diversidade de idéias que há para se
perceber na obra de Boyle, um retrato até então sem precedentes do universo dos
viciados em drogas –talvez, a obra cinematográfica que tenha chegado mais perto
de uma observação tão apurada e estilizada quanto a deste filme tenha sido
somente (e olhe lá...) o audacioso “Drugstore Cowboy”, de Gus Van Sant, de
1989.
Passado nos anos 1990, “Trainspotting”
acompanha a rotina de jovens drogados dos subúrbios da Escócia, com ênfase no
ponto de vista do protagonista, Mark Renton (um inspirado Ewan McGregor). A
turma de Renton é impagável: o mala-sem-alça e fã passional de Sean Connery, Sick
Boy (Johnny Lee Miller); o esquisito, irrequieto e simpático Spud (Ewen Bremmer); o certinho Tommy (Kevin McKidd) e o psicótico Begbie (Robert Carlyle).
A trama inicia-se numa das muitas e inúteis
tentativas de Renton em largar seu vício, mas ele só passa a levar tal atitude
a sério quando tragédia irreversíveis de fato começam a pesar sobre ele e sobre
seus amigos.
Um das grandes sacadas de Boyle e do roteiro de
John Hodge foi isentar-se de julgamentos morais e retratar a condição do vício
inicialmente de forma bastante subjetiva –há um momento em que Renton relata
que o êxtase provocado pela droga é “melhor do que mil orgasmos!” –vale dizer
que isso provocou enorme controvérsia quando do lançamento deste filme nos EUA.
O que os moralistas conservadores não perceberam foi a diferença entre as
ideologias do protagonista e do autor: Conforme avança sua narrativa sobre a
vida de Renton, Danny Boyle desconstrói sua fascinação pelas drogas e sua
convicção no êxtase feliz que elas proporcionam imprimindo uma espiral de
tormento e dor de tal forma impiedosa e irônica que só encontra paralelo no
inteligente senso de humor que ele aproveita para destilar –este foi, em inúmeros
aspectos, um filme bem a frente de seu tempo.
É curioso perceber que, por isso mesmo, pouco a
pouco “Transpotting” se firma também como um formidável registro do
comportamento e da mentalidade geracional da década de 1990.
“Quem Quer Ser Um Milionário?” pode ter lhe
dado o Oscar de Melhor Diretor, e ele pode ter feito muitos ótimos filmes
depois disso, mas ainda é “Trainspotting” o grande trabalho da carreira de Danny
Boyle.
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