quarta-feira, 19 de abril de 2017

Amadeus

Na calada da noite, o já idoso Salieri (F. Murray Abrahams numa atuação espetacular) surta aos gritos com uma revelação: Ele é o único e verdadeiro responsável pela morte de Wolfgang Amadeus Mozart (Tom Hulce, exultante).
É a partir desse momento que descortina-se –e, com efeito, regressa algumas décadas no tempo –a narrativa sempre prodigiosa, elegante e incisiva do diretor tcheco Milos Forman que se debruça, junto com o roteiro brilhante de Peter Shaffer, sobre os detalhes perniciosos da relação cheia de dualidade entre Salieri e Mozart quando estes se conheceram na corte do rei da Áustria (Jeffrey Jones), para quem Salieri lecionava música e na qual Mozart chegou como um vendaval com sua fama –justificada por seu imenso talento –e seu irreprimível carisma.
Mozart, mesmo depois de casado (com a jovem e esfuziante Constanze, vivida por Elizabeth Berridge) não resiste a um rabo de saia (e o rabo de saia em questão é Katerina Cavalieri, objeto de desejo de Salieri), e nem à liberdade (ou libertinagem!) criativa proporcionada pelas apresentações da ópera popular, onde sua inspiração dá vida à peças antológicas.
Há, entretanto, um lado obscuro em Mozart: E ele diz respeito ao amortecimento frio e sombrio que toma conta de sua alma no que diz respeito à opressão que a figura de seu pai –mesmo depois de morto –exerce sobre ele, e ao dar-se conta disso, Salieri passa a valer-se disso para conduzir uma corrosiva e destrutiva vingança contra Mozart.
Se existe um porém em “Amadeus”, é a forma demagógica com que o roteiro (e a peça que o inspirou) faz uso de eficientes expedientes da ficção para, em nome da estrutura de convenção, colocar Salieri como um vilão rancoroso, sinistro e manipulador, características que a interpretação astuciosa e minuciosamente humana de Abrahams tenta, na medida do possível, contornar.
São, contudo, questões menores diante da realização absurdamente arrebatadora que Milos Forman obteve aqui, indo um passo além, no que diz respeito à orquestração perfeita de valores assombrosos de produção, ao seu também impecável “Um Estranho No Ninho”.
“Amadeus” venceu oito Oscars na cerimônia de 1982: Melhor Filme, Melhor Diretor (para Milos Forman), Melhor Ator (para F. Murray Abrahams, que tinha entre seus concorrentes o próprio Tom Hulce), Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Direção de Arte, Melhor Som, Melhor Figurino e Melhor Maquiagem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário