Na calada da noite, o já idoso Salieri (F.
Murray Abrahams numa atuação espetacular) surta aos gritos com uma revelação:
Ele é o único e verdadeiro responsável pela morte de Wolfgang Amadeus Mozart
(Tom Hulce, exultante).
É a partir desse momento que descortina-se –e,
com efeito, regressa algumas décadas no tempo –a narrativa sempre prodigiosa,
elegante e incisiva do diretor tcheco Milos Forman que se debruça, junto com o
roteiro brilhante de Peter Shaffer, sobre os detalhes perniciosos da relação
cheia de dualidade entre Salieri e Mozart quando estes se conheceram na corte
do rei da Áustria (Jeffrey Jones), para quem Salieri lecionava música e na qual
Mozart chegou como um vendaval com sua fama –justificada por seu imenso talento
–e seu irreprimível carisma.
Mozart, mesmo depois de casado (com a jovem e
esfuziante Constanze, vivida por Elizabeth Berridge) não resiste a um rabo de
saia (e o rabo de saia em questão é Katerina Cavalieri, objeto de desejo de
Salieri), e nem à liberdade (ou libertinagem!) criativa proporcionada pelas
apresentações da ópera popular, onde sua inspiração dá vida à peças antológicas.
Há, entretanto, um lado obscuro em Mozart: E
ele diz respeito ao amortecimento frio e sombrio que toma conta de sua alma no
que diz respeito à opressão que a figura de seu pai –mesmo depois de morto
–exerce sobre ele, e ao dar-se conta disso, Salieri passa a valer-se disso para
conduzir uma corrosiva e destrutiva vingança contra Mozart.
Se existe um porém em “Amadeus”, é a forma
demagógica com que o roteiro (e a peça que o inspirou) faz uso de eficientes
expedientes da ficção para, em nome da estrutura de convenção, colocar Salieri
como um vilão rancoroso, sinistro e manipulador, características que a
interpretação astuciosa e minuciosamente humana de Abrahams tenta, na medida do
possível, contornar.
São, contudo, questões menores diante da
realização absurdamente arrebatadora que Milos Forman obteve aqui, indo um
passo além, no que diz respeito à orquestração perfeita de valores assombrosos
de produção, ao seu também impecável “Um Estranho No Ninho”.
“Amadeus” venceu oito
Oscars na cerimônia de 1982: Melhor Filme, Melhor Diretor (para Milos Forman),
Melhor Ator (para F. Murray Abrahams, que tinha entre seus concorrentes o
próprio Tom Hulce), Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Direção de Arte, Melhor Som, Melhor Figurino e Melhor Maquiagem.
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