Nicole Kidman está mesmo tentadora neste ótimo
filme, talvez, o melhor já engendrado por Gus Van Sant que aqui harmoniza como
nunca antes em sua carreira as propensões de cinema comercial com uma saudável
e salutar reflexão típica do cinema independente.
Ele não dá folga ao expectador: Realizador
ainda jovem (o filme é de 1995) e ávido por experimentações na área de seu
ofício, Van Sant constrói uma narrativa intrincada e fragmenta que se auto-impele
o tempo todo, indo e vindo no passado e presente, deixando que o ‘antes’ se
esclareça pelo comentário do ‘depois’.
Tudo isso molda uma crítica afiada, inteligente,
mas nunca rabugenta, nem pretensamente séria, à mentalidade muito classe média
e bem norte-americana de ‘vencer a qualquer preço’.
Essa condução ainda que confusa em primeira
vista (e sensacional numa revisão) jamais perde o charme e a capacidade de
envolver o expectador, em muito graças ao bem conduzido elenco que, nas mãos de
Van Sant, entrega atuações cheias de ironia e controlada perplexidade.
É por isso que desde o início sabemos que algo
de bem errado aconteceu, e que o cerne dessa possível tragédia –que não sabemos
o que foi, mas assistimos diversas testemunhas dando seu parecer a esse
respeito –é a ambiciosa (e deliciosa) Suzanne Stone (Nicole Kidman, no papel
responsável por ela ter se tornado uma estrela na década de 1990), uma ‘garota
do tempo’ da emissora de TV de uma cidadezinha que sonha com o estrelato –e com
tal determinação ela almeja esse sonho que suas atitudes no dia-a-dia soam de
um exagero e histrionismo absurdo, e por isso mesmo possível!
Suzanne é casada com Larry Maretto (Matt
Dillon, que trabalhou com Van Sant no ótimo “Drugstore Cowboy”), o
relativamente ingênuo e grosseiro dono de um restaurante de comida italiana.
É por meio de uma reportagem sobre o cotidiano
de um grupo de adolescentes desajustados (entre eles um jovem Joaquim Phoenix e
o recém-oscarizado Casey Affleck), onde Suzanne vê a chance de deixar de ser a
mera apresentadora da previsão do tempo para alçar vôos mais altos, que ela
começa a enxergar o empecilho que seu marido pode significar em sua ascensão.
Inexplicavelmente pouco lembrado nos dias de
hoje –até então, ele sequer ganhou uma edição em DVD! –“Um Sonho Sem Limites”
está certamente entre os melhores trabalhos lançados nos anos 1990. Ele une o
ímpeto talentoso e criativo que Van Sant demonstrou em “Drugstore Cowboy”,
aliado ao prestígio (e conseqüente tarimba para um maior orçamento e um elenco
notável como este) obtido com “Garotos de Programa” –qualidades que não soube
expressar tão bem no filme seguinte, o imediatamente anterior “Até As Vaqueiras
Ficam Tristes”.
Van Sant ainda faria muitos
outros filmes e consolidaria uma carreira audaciosa ainda que cheia de altos e
baixos –incluindo algumas indicações ao Oscar por “Gênio Indomável” e “Milk-A
Voz da Igualdade" –mas, o seu melhor trabalho de direção continua sendo este
pulsante, divertido e sedutor conto de crime e castigo nos subúrbios norte-americanos.
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