“O certo e o errado parecem bem distintos. Mas,
se está pedindo para mandar meu povo matar ou morrer... sinto muito! Não posso
fazer isso, sinto muito!”
O conceito de uma aventura em tempo real era
uma arrojada inovação em 1952, quando foi lançado este belíssimo faroeste de
Fred Zinneman, atrevendo-se a ambientar os seus enxutíssimos oitenta e quatro
minutos no exato tempo correspondente que passa na história.
No dia de seu casamento com a bela Amy Fowler
(Grace Kelly, radiante em sua estréia no cinema), o xerife Will Kane (Cary
Cooper, numa grande performance que lhe valeu o Oscar de Melhor Ator) recebe
uma péssima notícia: está para chegar à cidade, no trem do meio-dia, o temido
fora-da-lei Frank Miller (Ian MacDonald), foragido da cadeia. Junto de seu bando
ele promete matar o xerife –que, à propósito, é o responsável por seu
encarceramento –e saquear a cidade.
Todos entram em pânico.
O homem da lei, conforme vão se passando os
minutos em tempo real, até o meio-dia, vê sendo recusados os seus pedidos de
ajuda para confrontar os bandidos.
Muito antes do recurso da narrativa em tempo
real se tornar defasada com a série “24 Horas”, este clássico primoroso e
certamente pioneiro no que tange a essas manobras narrativas no cinema já
impressionava as platéias, salientando o suspense das cenas por meio da
inventiva montagem (premiada com o Oscar) e de seqüências que insistem em
mostrar, nos relógios, o tempo que se passa.
“Matar Ou Morrer” venceu também o Oscar de Melhor
Canção para a lírica “Do Not Forsake Me, Oh, My Darling!” que, se for ouvida
com a audição apurada, nota-se que sua percussão reproduz o som de um trem que
se aproxima –um dos muitos lances geniais de ordem narrativa contidos nesta
produção.
Mas, a obra de Zinneman vai além de takes de
relógios e momentos de tensão: Seu filme lança uma discussão, surpreendentemente
ainda atual, sobre o protecionismo coletivo e individual (uma questão que
sempre pareceu perseguir o subconsciente norte-americano), e sobre as evasões
de covardia que orientam as prioridades do ser humano em sociedade, em
contraponto à uma espécie de coragem arcaica que parece perder-se com o
processo de civilização.
E ambientar tal reflexão no Velho Oeste é,
também ela, um ato de questionamento intrépido –trata-se de colocar um espelho
perante o expectador e afirmar que ele não é tão parecido com seus heróis
quanto poderia supor. Não à toa, talvez por essa mesma razão, este filme
magistral encontrou fortes detratores em sua época (entre eles, o astro John
Wayne e o diretor Howard Hawks), que apontavam posturas inconcebíveis nas
atitudes muito humanas do protagonista. Para aqueles que nutriam uma
mentalidade mais machista, então, o fato da personagem maravilhosa de Grace
Kelly revelar-se, no trecho final, como o único apoio e auxílio real do
personagem principal deve ter soado quase como uma ofensa!
Por isso mesmo, um dos
clássicos mais admiráveis e pertinentes do cinema.
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