Segunda parte de uma trilogia que concebeu –e
cujo filme inaugural é o prestigiado “Samurai do Entardecer” –este filme do
diretor Yoji Yamada tem a particularidade de entregar uma trama que se
desfralda aos poucos perante o expectador, assim como uma ênfase dramática de
natureza mais íntima, o que paradoxalmente reforça as (poucas) cenas de lutas
de espada quando estas ocorrem.
O início do filme acompanha dois grandes amigos
que servem como samurais ao xogunato, um sistema que atravessava períodos de
mudança.
Katagiri (Masatoshi Nagase) e seu amigo
negociam o casamento dele com sua irmã, no entanto, este plot tem pouca
importância à narrativa; percebemos que, por alguma razão ainda não revelada, a
câmera de Yamada se concentra não nesses personagens (Katagiri, sua irmã e o
amigo pretendente), mas em Kie (Takako Matsu), a bela empregada que procura
manter-se discreta durante toda a cena. Não é à toa: Será ela, de fato, o cerne
de uma das duas tramas paralelas que conduzem o filme.
Kie e Katagiri se amam, mas as diferenças de
castas tornam sua união inapropriada, fato que a leva a desposar um comerciante
com o qual acaba por sofrer maus-tratos. Katagiri confronta o protocolo e a
aceitação social ao tirá-la da casa do esposo onde é deixada quase para morte
de doença e a leva de volta para sua moradia.
Ainda que felizes juntos, essa é uma situação
que nenhum deles será capaz de sustentar por muito tempo.
A segunda trama de “A Espada Oculta” –e que se
entrelaça com a primeira somente na medida em que as duas sintonizam suas
tensões –envolve um ex-samurai, antigo amigo de Katagiri, e que agora acabou
preso por aliar-se à reformistas do governo.
A maior abertura do governo à negociações
exteriores trouxe as novidades da artilharia bélica (as cenas onde tentam
disparar um canhão ou operar com rifles e baionetas são divertidas), deixando
os samurais, seu código de honra e seu estilo de combate à beira do
obsoletismo. Diante disso, são naturais os esforços de alguns para deter as
transformações em sua cultura, o quê faz de alguns samurais, como Katagiri,
suspeitos de uma traição em potencial.
A chance para que ele prove sua lealdade vem em
forma de uma imposição cruel: Quando seu antigo amigo escapa da prisão,
Katagiri (com quem ele partilhou o mesmo árduo treinamento) recebe a
incumbência de matá-lo e assim provar-se merecedor de confiança.
A saída para escapar com vida nesse duelo, para
Katagiri, talvez esteja em extrair de seu antigo mestre uma lição que ele não
havia lhe ensinado: o golpe da Espada Oculta.
Há toda uma elaborada conscientização temática
a unir esses filmes sobre ‘samurais pobres’ concebidos por Yamada, e diz
respeito ao fato, nem sempre observado em aventuras que reforçam a bravura, o
vigor e a invencibilidade dos protagonistas, de que mesmos os mais intrépidos e
implacáveis samurais (ou talvez, sobretudo, eles) partilhavam de um medo
avassalador de morrer ante o fio de uma espada nos duelos que disputavam.
Em seus belíssimos
trabalhos, Yamada tangencia e potencializa esse medo –grande responsável pela
impecável tensão que domina o filme –através das tramas familiares, quase
sempre a respeito de questões afetivas que cercam os guerreiros entre as quatro
paredes de suas casas: Para o diretor, a idéia, por exemplo de morrer sem
jamais tornar a rever a mulher amada ou de perder a oportunidade de declarar um
amor não declarado é mais assustadora que a ferocidade de qualquer adversário.
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