Era uma vez um menininho que se sentia
incompleto. Seu aspecto algo soturno o tornava desajustado em meio às pessoas
normais, e seus dons artísticos despertavam fascínio em alguns e desconfiança
em outros. O nome desse menininho era Tim Burton.
Quando cresceu, ele aprendeu a expressar as
inquietações de ser diferente através da arte que adotou como sua, o cinema, e
assim surgiram filmes pessoais e peculiares como o curta-metragem
“Frankenweenie” e o longa “Os Fantasmas Se Divertem”.
Após o imenso êxito que ele obteve com sua
adaptação de “Batman”, em 1989, ele conseguiu viabilização dos estúdios para
criar uma história que há muito tempo estava em seu coração.
Essa história se chamava “Edward-Mãos de
Tesouras”.
Era sobre um rapaz construído de maneira
artificial (no melhor estilo “Frankenstein”, um dos filmes prediletos do jovem
Burton) por um velho inventor (Vincent Price, numa atuação tocante) que, por
ironia do destino, morre antes de finalizá-lo: Exatamente quando estava prestes
a substituir as tesouras afiadas que lhe serviam de mãos, por mãos humanas de
verdade.
O rapaz, Edward (um jovem Johnny Depp que
agarra o papel com unhas e dentes), fica então sozinho naquele castelo no alto
de uma montanha, até que surge Peggy (a maravilhosa Dianne Wiest), uma
vendedora da Avon que se compadece de sua solidão e o leva para sua casa.
Vivendo em sociedade, Edward atravessa por
fases previsíveis: Primeiro é recebido com a euforia do ineditismo com que são
tratadas as novidades, mas, depois, passa a sofrer a maledicência típica
daqueles que não compreendem o diferente.
Depois de se apaixonar pela filha de Peggy, Kim (Winona Ryder, belíssima) e de ser enganado pelas mentiras do namorado dela (um vilanesco Anthony Michael Hall), ele passa a ser perseguido.
Depois de se apaixonar pela filha de Peggy, Kim (Winona Ryder, belíssima) e de ser enganado pelas mentiras do namorado dela (um vilanesco Anthony Michael Hall), ele passa a ser perseguido.
Tim Burton permite que as emoções muito
pessoais –fruto de experiências que ele mesmo deve ter vivido –transpareçam em
seu registro algo melancólico desse comportamento preconceituoso e mesquinho
que o ser humano não raro adquire em coletividade, mas ele o faz com um senso
de humor contagiante e um lirismo que afasta qualquer impressão de rancor deste
seu trabalho, talvez o melhor de sua carreira.
Com “Edward-Mãos de Tesouras”, Tim Burton,
afinal, encontrou a si mesmo: A partir deste filme ele enfim consolidou o
estilo que já tateava com expressão em seus trabalhos anteriores e que seria a
pedra fundamental para a escolha de praticamente todos os seus projetos daqui
por diante; um estilo que se reflete numa forte identidade visual, obtida,
sobretudo, graças aos hiperlativos valores na direção de fotografia de Stefan
Czapsky, na direção de arte de Bo Welch, e na emocionante trilha sonora de
Danny Elfman, provavelmente a melhor de sua carreira. Foi aqui, também que ele
conheceu aquele que pode ser considerado seu ator-fetiche, Johnny Depp, aquele
que melhor incorporou o alter-ego, e as expectativas autorais que saíram da
mente de Burton, em filmes diversos como “Ed Wood”, “A Lenda do Cavaleiro Sem
Cabeça”, “Sweeney Todd-O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet” e tantos outros.
Como é sintomático em sua carreira, Burton
conduz o filme à um desfecho que homenageia os filmes de monstro de antigamente
que ele tanto amou, onde a criatura (Edward) era sempre vista sendo perseguida
pelos moradores da aldeia até seu solitário castelo. Mas, “Edward-Mãos de
Tesoura” é também um conto de fadas, e Burton não deixa que ele termine numa
nota de consternação –ao fim, descobrimos que Edward é o grande responsável por
criar a neve, numa forma de celebrar o mundo que ele conheceu (e no qual
descobriu o amor), mas, para o qual não é seguro voltar.
Como Burton, sua criação é
o artista, enfim, que expressa suas angústias e felicidades através de sua
arte, e consegue o feito de embelezar um pouquinho mais o mundo com ela.
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