O diretor Ron Howard já experimentou a consagração com “Uma Mente Brilhante”, e o largo sucesso com “Código Da Vinci”, contudo, de uns anos pra cá, seu cinema tornou-se claudicante, oscilando entre uma técnica apurada, um profissionalismo nítido e um vazio de iniciativa, de inspiração que engessava seus trabalhos.
Embora seja uma obra relativamente interessante
e pertinente (ainda mais inserida no panorama genérico atual do cinema
norte-americano), “Éden” padece de alguns desses lapsos.
Baseado num fato real transcorrido no início do
Século XX, “Éden” constrói uma narrativa a partir de indícios muitas vezes
contraditórios em relação aos acontecimentos retratados. Na ânsia de
concretizar os fatos sem assumir pontos de vistas unilaterais, o roteiro de Noah
Pink, a partir de conceitos elaborados por ele e pelo diretor Ron Howard,
oferece uma cadeia de acontecimentos que terminam não priorizando a postura,
nem a índole de ninguém, o resultado é um filme onde pessoas torpes são
ocasionalmente confrontadas com outras ainda piores, numa exposição algo
involuntária da inerente maldade humana.
Após a Primeira Guerra Mundial, o médico e
filósofo Friedrich Ritter (Jude Law) parte para a Ilha Floreana na distante região
dos Galápagos, junto da colega Dore Strauch (Vanessa Kirby) a fim de se afastar
da humanidade e de criar, ali, um conceito inédito de meio de vida, rompendo
com as defasadas considerações sociais, e muito amparado no niilismo espartano
de Friedrich Nietzsche. Todavia, uma fagulha de vaidade e de necessidade de ser
enaltecido ainda queima dentro do Dr. Ritter, por isso, de tempos em tempos,
nas visitas de algum navio errantes por aquelas águas longínquas, ele aproveita
para enviar ao mundo exterior suas cartas, nas quais deposita sua retórica sobre
essa nova forma alternativa de existência, que ele enxerga como um manifesto
contra a tendência auto-destrutiva dos governos mundiais.
Com o tempo, suas cartas –publicadas em jornais
e revistas da época –se tornam uma espécie de sensação, e o Dr. Ritter, um lenda
em seu exotismo. Até que, no inverno de 1932, o exemplo de Ritter leva Heinz
Wittmer (Daniel Brühl), sua esposa Margret (Sydney Sweeney) e seu filho
(Jonathan Tittel), à Ilha de Floreana, a fim de partilhar dessa mesma vivência,
esse rompimento com os grilhões de conveniência social.
O filho de Heinz sofre de tuberculose, então
intratável, com péssimas perspectivas pela medicina da época, e a jovem esposa,
Margret, está, ainda sem saber, grávida. Ao chegarem em Floreana, o Dr, Ritter
e Dore, arredios, os recebem com inesperado desdém –a contundente utopia que
eles planejavam ali não vinha atrelada à traquejo social, e nem tampouco era
pensada para envolver outros além deles próprios.
Instalados, de início, numa das cavernas da
região (!), Heinz e Margret vão se adaptando à duras penas, construindo uma
casa e erguendo um lugar onde almejam, de fato, viver –esses percalços surgem
registrados nas cartas que Marget, então com 23 anos, escreve e envia, de
tempos em tempos para a mãe.
No entanto, algum tempo depois, chega em
Floreana outra comitiva, aquela que, desta vez, realmente irá virar tudo de
pernas pro ar: Os subalternos, criados e meros bajuladores da Baronesa Eloise
Von Wagner de Bousquet (Ana De Armas, ligeiramente histriônica no retrato de
uma das mais odiosas vilãs do cinema recente). Afirmando estar lá na ilha para
a construção de um hotel exclusivo para turistas muito ricos, a Baronesa se
instala, com seu séquito –entre os quais, o amante e capacho Lorenz (Felix
Kammerer, de “Nada de Novo No Front”) e outro amante (!) e guarda-costas
Phillipson (Toby Wallace) –numa interseção entre as moradas de Ritter e Dore, e
de Heinz e Margret. Ela cria divergências –abre as correspondências de Ritter e
tenta colocar a culpa em Heinz –protagoniza excessos e age com displicência
–quando a comida que levou (e que consomem desordenadamente) acaba, envia seus
lacaios para roubar de Heinz e Margret.
Não demora muito para que esse paraíso (que de
paradisíaco, desde o começo, nunca teve nada!) se torne um inferno com os conflitos
de ordem íntima criados por ela –na realidade, a própria Baronesa é, em si, um
embuste: Uma golpista que singrou a Europa manipulando homens ricos com sua
beleza, ela tenta sua última cartada ali, em Floreana, na tentativa de se
estabelecer no que pode ser um empreendimento imobiliário legítimo, valendo-se
de todos aqueles que sua lábia e sua capacidade de sedução arregimentarem em
favor de seus interesses.
O que acontece, todavia, é um caldeirão de
tensões que, eventualmente, irá explodir.

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