sábado, 2 de setembro de 2017

A Espiã

Um dos clássicos do início dos anos 1970 e começo dos 1980 que fizeram a fama do diretor Paul Verhoeven, ainda em sua Holanda natal, foi “O Soldado de Laranja”, que acompanhava as peripécias de um oficial holandês inescrupuloso vivido por Rutger Hauer.
É um tema bastante similar que Verhoeven revisita aqui (um personagem às voltas com o lado mais obscuro e lascivo da guerra), em seu melhor filme nas últimas décadas.
Durante a Segunda Guerra Mundial, Rachel Stein (Carice Van Houten, dona de uma beleza clássica adequada ao tom e à ambientação da produção), uma ex-cantora judia cuja família foi toda dizimada numa tentativa de escapar ao jugo nazista da Holanda ocupada, une-se à resistência para combater os alemães, assumindo a identidade de Ellis De Vrie.
Uma vez transformada em espiã, a missão de Rachel/Ellis passa a ser infiltrar-se como prostituta de luxo num QG alemão e valer-se de seu indisfarçável sex-appeal para seduzir o diretor de Inteligência Alemã na Holanda, Muntze (Sebastian Koch, de “A Vida dos Outros”), e obter informações.
Para Ellis, sua incumbência tem dupla importância pessoal: Ela deseja fazer justiça ao perverso oficial alemão Franken (Waldemar Kobus) que assassinou sua família; e, no processo, resguardar o relacionamento genuíno que construiu com Muntze.
Entretanto, as coisas serão muito mais complicadas do que parecem. Em meio à uma audaciosa tentativa de libertar prisioneiros quase prestes a serem executados, dá-se uma reviravolta tão dramaticamente radical que poderia pertencer a uma obra de ficção (o filme é baseado em fatos reais): Eis que por meio de uma escuta que ela mesma plantou, Ellis é descoberta por Franken, que se vale da circunstância para fazer os aliados dela (que podiam apenas ouvi-lo) acreditarem que ela é uma traidora.
Pouco depois, as Forças Aiadas invadem a Holanda, subjugando os alemães.
contudo, a situação de Ellis é delicada: Perseguida pelos nazistas por seu envolvimento na Resistência, ela agora é também perseguida por seus antigos companheiros que acreditam ser ela uma traidora.
sua única alternativa é Muntze, ao lado de quem ela tentará descobrir a verdadeira (e surpreendente) identidade do traidor de fato, neste formidável suspense de guerra repleto de agentes duplos, aliados que se tornam inimigos e inimigos que se tornam aliados.
Mais conhecida por seu papel como a Sacerdotisa Vermelha na série “Game Of Thrones”, a atriz Carice Van Houten é uma grata revelação neste belo trabalho de Verhoeven que teria todos os trejeitos e características de um thriller à moda antiga, não fosse a presença audaz de generosas cenas de nudez e sexo, além de outros costumeiros excessos de seu ousado realizador –e que, vez ou outra, desabilitam a harmonia do todo. Entretanto, o próprio Verhoeven é quem, deveras, consegue brilhar como diretor: Além de uma condução tão coerente e serena que inspira até tranqüilidade, ele pontua sua trama com pequenos e inteligentes detalhes que somados conseguem a um só tempo homenagear e questionar os filmes antigos de guerra; sendo um de seus elementos mais notáveis a introdução do ambíguo personagem nazista de Sebastian Koch que desafia o público e a protagonista a gostarem dele.

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