Em determinados exemplares é possível
identificar os códigos que tão bem relacionam os filmes de samurais aos filmes
de faroeste. Em ambos os casos, personagens são confrontados, não raro, com
seus protocolos de honra postos a prova por circunstâncias selvagens e que
culminam em duelos de vida ou morte. Em ambos os gêneros, o ambiente antiquado
molda homens que precisam emergir da selvageria para aprender, num ensaio de
civilização que representam, separar o joio do trigo.
Em “Crônicas dos Shinsengumi” essa similaridade
é de um primor que jamais escapa à habilidade do diretor Kenji Misumi.
Os Shinsengumi são uma guarda de samurais
montada pelo xogunato (mostrados também na obra-prima “A Última Espada”) para
assegurar sua autonomia nas cidades que integram o feudo. Nesse período antigo
em que discussões políticas acaloradas se resolviam na lâmina da espada, a
cidade de Kyoto é assolada por conspirações contumazes de imperialistas e
separatistas, opositores descontentes com o regime do xogum. Não ajuda em nada
o líder local dos Shinsengumi ser um homem imprudente, fútil e arrogante.
A entrada do jovem e idealista Yamazaki (Raizo
Ichikawa) para os Shinsengumi coincide com a primeira tentativa bem-sucedida do
segundo em comando, o filho de camponês Kondo (Tomisaburo Wakayama, de “Lobo
Solitário”) em tomar o poder por baixo dos panos. Entrentanto, tal ato arranha
profundamente a admiração de Yamazaki pela honradez rígida dos samurais.
Os transtornos, contudo, não acabaram, os
separatistas preparam uma intervenção que consumirá Kyoto nas chamas, e no
momento, seu maior aliado por obter sucesso, são as complicações de ordem
política que afligem a união dos Shinsengumi.
Neste formidável épico sobre retidão moral e
desilusão, o diretor Kenji Misumi (também ele, de “Lobo Solitário”) não se
acanha em aprofundar-se nas questões complexas e arbitrárias que enevoam a
hierarquia, nem nas emoções conflitantes que dificultam o cumprimento do dever,
ao contrário do que fariam nove dentre dez diretores de ‘chambara’. Misumi
investiga o investimento emocional e ético de ser um samurai com a mesma ênfase
e voltagem que observa o sangue fluir nas batalhas de espada e, desse esforço,
consegue extrair um filme poderoso, envolvente e absolutamente bem equilibrado
entre uma trama de intrincadas ramificações políticas e um admirável filme de
aventura.
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