terça-feira, 28 de novembro de 2017

A Espada Bijomaru

Só mesmo Kenji Mizoguchi para fazer um filme de samurais de conotações tão pessoais.
Ele conta uma historia curiosa de desventuras, recriminações e pesares que convergem numa narrativa empolgante e que ele trata de transformar em algo tão seu, tão imbuído das questões que sempre foram caras ao seu cinema.
Durante a era do xogunato, um humilde ferreiro, enamorado da destemida filha de seu benfeitor, prepara para ele um presente: Uma espada que ele julga ser formidável.
Mas, o benfeitor, Onoda (Ichijirô Oya), durante um ataque de ronins a favor do xogunato e contra o império, vê sua espada se quebrar numa tentativa de lutar contra os inimigos. Tal desonra leva Onoda à uma espécie de prisão domiciliar, e Kiyone (Shôtarô Hanayagi) o ferreiro, à uma profunda crise moral de culpa.
Pior: Durante sua prisão, o simpatizante do xogunato, Kiyotsugu (Kan Ishii), tenta barganhar com Onoda oferecendo a ele a liberdade em troca da mão de sua filha em matrimônio. Diante da recusa de Onoda em usar a filha como moeda de troca, Kiyotsugu o ataca, terminando por matá-lo.
Para Kiyone, agora, forjar uma nova espada é uma questão de honra. Não apenas para se mostrar digno dos ensinamentos de seu mestre –que recentemente faleceu –mas, também para que possa se redimir, concedendo à jovem Sasae (Isuzu Yamada), uma espada com a qual ela possa matar Kiyotsugu e vingar seu pai.
Curioso na junção inesperada que faz de elementos dramáticos com reflexos narrativos de filmes de samurai, enxutíssimo (dura meros sessenta e quatro minutos) e absolutamente notável em sua qualidade insuspeita (há, pelo menos duas cenas antológicas: A forjadura da espada com Kiyone imaginando, no auge de uma dedicação genuína e apaixonada de seu ofício, a jovem Sasae ajudando-os a martelar e a moldar o aço; e a esplêndida tomada da luta final, um take ininterrupto, sutil, objetivo e primoroso imbuído de perícia e tensão), este singelo misto de drama e aventura mostra a versatilidade de Mizoguchi, e a habilidade natural que ele tinha para trabalhar temas com extrema perspicácia e noção narrativa –a despeito do fato de que o cinema japonês de ação, naqueles anos 1940, tateava em busca de solidez técnica (percebe-se que o desenho de som se mostra equivocado e desorientado, sobretudo, nas cenas de luta) –aqui, ele subverte certas tendências comerciais em função de uma trama que absorve sentimentos complexos como a culpa, a perda da auto-confiança e o desejo de vingança, e ainda quebra de forma sensacional alguns paradigmas da época ao colocar –provavelmente, antes de todos os seus conterrâneos –uma mulher como o personagem essencial e pivotal para o catártico ajuste de contas contra o antagonista.
Uma obra menor, mas ainda assim, digna de pertencer a um dos maiores diretores de todos os tempos.

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