sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

E.T. O Extraterrestre

Em face da obra absolutamente enraizada na cultura pop que se tornou, é difícil avaliar “E.T.” como um filme normal –algo que ele está longe de ser em todos os âmbitos cabíveis.
E embora sua mistura de fantasia, drama e aventura ainda seja tão primorosa quando era na época de seu lançamento, 1982, mesmo lá, não foram todos que notaram aquele que talvez seja o maior mérito do filme de Spielberg: Embora trate-se de um filme para crianças, com premissa e proposta de filme para crianças, Spielberg, em momento algum, abre mão de fazer dele uma grande obra cinematográfica em todos os seus aspectos.
É sempre comum, até os dias de hoje, atribuir certa condescendência às obras infanto-juvenis, e essa discriminação começa pelos próprios realizadores: Quando são as crianças o público-alvo, é normal esperar que o filme tenha certo desleixo na dramaturgia e pouco cuidado em aspectos como atuação, decupagem, roteiro –são, afinal, elementos que as crianças nem irão notar, não é mesmo?
Mas, é exatamente na contramão dessa mentalidade que vai “E.T. O Extraterrestre”.
A cada instante de filme Steven Spielberg insiste em fazer dele cinema de primeira, a começar pela atuação irrepreensível do trio de crianças que irá protagonizar a grande totalidade da trama –ainda que os créditos insistam em dizer que é Dee Wallace (intérprete da mãe das crianças) a protagonista do filme.
O menino Henry Thomas –que vive Elliot, o personagem principal –seu irmão mais velho Michael (Robert MacNaughton) e a caçula, a pequena Gertie (Drew Barrymore, adorável) são de uma precisão interpretativa surpreendente para três crianças. Este filme inclusive é o grande responsável pelo reconhecimento de Spielberg como hábil diretor de elencos infantis.
O próprio roteiro, escrito por Melissa Mathison, esposa do ator Harrison Ford na época, também deposita imensa confiança na capacidade de compreensão em níveis sentimentais dos pequenos: Após o que parece ser uma vinda à Terra para coletar espécimes de plantas, um pequeno extraterrestre é deixado para trás por seus semelhantes e, perseguido por soldados e cientistas do governo acaba por se refugiar na casa de um garotinho chamado Elliot –a própria aparição gradual de E.T. aos olhos do público (cuja concepção visual passa longe de qualquer bichinho fofinho, demonstrando um desafiador aspecto repulsivo) é um trabalho de sutileza e cuidado da parte do diretor Spielberg que deve ter pegado muita gente de surpresa nos anos 1980.
Elliot e E.T. acabam por desenvolver um poderoso vínculo a ponto de um sentir o que o outro sente –a cena em que E.T. bebe cerveja levando Elliot a ficar bêbado e atrevido durante a aula é divertidíssima e agrega uma das espertas referências de Spielberg, fã que ele é da Velha Hollywood: A reprodução de uma das cenas clássicas do delicioso “Depois do Vendaval”.
Entretanto, como o próprio alienígena aprende a dizer em nossa língua, ele deve voltar para casa, e seus amigos deverão ajudá-lo contra aqueles que desejam impedi-lo.
Sob muitos aspectos, este filme seminal de fantasia de Steven Spielberg tem a característica de tornar redundante tudo o que puder ser falado sobre ele: Ao conduzir sua obra com um senso de observação rico em preciosismo, onde o universo infantil ganha ênfase, até mesmo na forma notadamente opressora com que os adultos são tratados, Spielberg concebe a pedra fundamental de todo o seu cinema –nele estão todas as características que definiam e ainda viriam a definir sua visão de mundo e de narrativa, como a dolorida ausência paterna (algo presente na grande maioria de seus trabalhos), a salutar falta de indulgência para com as crianças, a técnica primorosa que só melhorou e se aperfeiçoou a cada filme, e seus impecáveis elementos técnicos, como os até hoje assombrosos efeitos visuais e, acima de tudo, a grandiosidade sinfônica da trilha sonora de John Williams.

Esses e outros aspectos são menores, ainda assim, perto de seu encanto.

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