Este trabalho do diretor sul-coreano Jee-Won
Kim (de “Os Invencíveis” e “O Último Desafio”, com Arnold Schwarzenegger) é, em
sua premissa, um dos mais sensacionais duelos já orquestrados pelo cinema.
Com efeito, ele contrapõe dois antagonistas que
são os extremos superlativos daquilo que fazem. E, como toda obra magistral, o
faz pouco a pouco, deixando que o expectador saboreie os pormenores de seu
registro e se experimente o suspense de sua condução.
Kyung-Chul (Choi Min-Sik, o Oh Dae Su de “Old
Boy”) é um psicopata implacável. Não existe qualquer possibilidade de empatia
por suas vítimas que o impeça de deflagrar atrocidades com elas. Sua sede de
sangue é algo imensurável. Ele rastreia suas vítimas de cidade em cidade,
capturando-as em meio às pessoas da multidão (são quase sempre jovens
mulheres), enredando-as com um falso aspecto inofensivo e linguajar polido para
então revelar, nos instantes mais íntimos e vulneráveis, suas psicóticas
intenções.
Mas, os atos de Kyung-Chul pavimentam o caminho
para o único capaz de confrontá-lo: Kim Soo-Hyeon (Lee Byung-Hun), uma espécie
de agente secreto –quase uma versão sul-coreana de Jason Bourne! –de quem
Kyung-Chul tem a audácia de assassinar a própria esposa.
Tomado pelo desejo de vingança, Soo-Hyeon toma
a decisão de submeter Kyung-Chul à um nível insano e inumano de sofrimento e
dor: Encontrá-lo, para ele, é algo que relativamente se realiza com rapidez e
simplicidade (um das muitas sacadas primorosas do diretor Jee-Won Kim em
contrariar todas as expectativas condicionadas do expectador com um andamento
tão primoroso quanto absolutamente imprevisível), o quê Soo-Hyeon planeja é
deixar Kyung-Chul livre e torturá-lo, aos poucos, tirando uma a uma as vítimas
de suas garras só para massacrá-lo em cada ocasião e largá-lo ao léu para
apanhar na frustrada tentativa seguinte.
O expectador ainda estará absorvendo a maestria
narrativa dessa primeira metade quando o diretor Jee-Won Kim dá uma nova
guinada na trama e revela um novo e audacioso plano de Kyung-Chul para virar o
jogo e revidar os maus tratos de seu perseguidor –e o filme avança com uma
genial imprevisibilidade que só poderia mesmo vir de um gênio em ação, como
acontece com freqüência nessa admirável escola de cinema da Coréia do Sul.
Feito com uma percepção tão afiada e profunda
dos meandros da psicose e do ardil vingativo que chega a ser alarmante para
quem o assiste, “Eu Vi O Diabo” introduz, em cada ato arrebatador de sua trama,
reflexões pertinentes à situação que constrói, como a distinção cada vez mais
cinza e borrada entre o serial killer digno de ser castigado e seu inimigo,
motivado exclusivamente por vingança que, no processo dessa revanche, se coloca
num patamar de crueldade e frieza muito similar ao do monstro que enfrenta, ou
o fato perturbador de que, no conhecimento íntimo e pessoal da dor que inflige
e na loucura insondável da obsessão por essa mesma dor, não existem formas tão
válidas assim do protagonista causar ao seu nêmesis o sofrimento justo e
proporcional que ele inferiu em suas vítimas.
Um filme brilhante, de
tensão impecável e altíssima voltagem narrativa e que ainda se dá ao luxo de
fazer o público pensar: Uma obra-prima.
Nenhum comentário:
Postar um comentário