O maior mérito de “Me Chame Pelo Seu Nome”
talvez seja a sensibilidade inconteste com a qual o diretor Luca Guadagnino
narra essa trama sem maiores conflitos puramente dedicada ao registro eventual
de um amor de verão. Seu estilo exercita um verve sensorial toda apropriada
ao roteiro intuitivo de James Ivory (vencedor do Oscar) onde os planos de câmeras
capturam superfícies úmidas, impressões subjetivas, somados aos sons da
natureza que remetem prontamente a uma imersão.
O fato de tudo se ambientar na Europa, mais
precisamente na Itália (o elenco fala uma mescla espontânea de inglês, italiano
e francês), no ano de 1983, confere uma atmosfera sensual, lasciva e até diria
libertina que justifica a expressão sexual que o filme aos poucos vai adquirindo.
Mais do que um romance homossexual, “Me Chame
Pelo Seu Nome” é um romance bissexual; recebem a devida atenção da narrativa, a
primeira namoradinha de Elio, Marzia (vivida pela sensacional Esther Garrel) e
a paquera de Oliver, Greta (Victoria Du Bois).
Não restam dúvidas, porém, do imenso interesse
que o roteiro e a direção dedicam a seus protagonistas: Elio é um jovem
americano, filho de pais cultos, compreensivos e financeiramente privilegiados.
Passa os dias de verão transcrevendo e tocando música clássica na belíssima
mansão da família. Na atuação magnífica de Timothée Chalamet (de “Interestelar”),
Elio é também um painel de emoções relativas à idade que tem –tão expressivo
ele é que o filme prescinde de narração, diálogos ou qualquer outro subterfúgio
para sabermos o que ele sente e pensa.
Renomado professor, o pai de Elio (Michael
Stuhlbarg) chama um estudante também americano para auxiliá-lo numa pesquisa
num estágio de verão. E Elio, assim, conhece Oliver (Armie Hammer) que se
hospeda em sua casa.
De início, Oliver é uma incógnita. Parece polidamente
arredio, e estranhamente ausente no interesse que demonstra por coisas de fora
dos muros da vila. Aos poucos, porém, essa incógnita se converte, para Elio,
num outro tipo de interesse.
E, com a sutileza necessária a uma trama assim,
o diretor Guadagnino enlaça os dois personagens num caso de amor, acompanhando
atentamente as palpitações, o crescente do desejo, as impressões fortuitas e os
pequenos detalhes que conduzem às intensas reações do coração.
Para o filme (e para seus coadjuvantes), o fato
de serem dois personagens do mesmo gênero a se amarem parece assim ser
irrelevante –e há uma certa exaltação impar (acompanhada também de algum
lamento) por esse detalhe se mostrar tão notável.
Tão bem cuidado é o
trabalho de Guadagnino que ele só estabelece uma comparação válida com os dois outros
grandes filmes a tratarem sobre esse tema: “O Segredo de Brokeback Mountain”,
de Ang Lee e “Azul É A Cor Mais Quente”, de Abdellatif Kechiche. Como naquelas
duas produções, a questão da homossexualidade é tratada com maestria e
convicção que reduz a circunstância à sua perfeita essência –do amor puro e
simples –como nelas, a excelência obtida por sua equipe resultou numa obra
orgânica que encena de forma magistral as intenções, anseios, desejos e
sentimentos de seus personagens; e isso tudo culminou, nos três casos, num
rompimento de qualquer bloqueio preconceituoso à repercussão do filme levando-o
ao sucesso de público e crítica.
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