sexta-feira, 20 de julho de 2018

Vivos


Na década de 1980, o dramaturgo e roteirista John Patrick Shanley, depois do Oscar por “Feitiço da Lua”, tentou se auto-promover e virar um desses ‘autores-estrelas’, cujas obras guardavam uma espécie de marca –daí vieram trabalhos (alguns inclusive também dirigidos por ele) como a estranha aventura “Joe Contra O Vulcão” e a mais estranha ainda mescla de policial, drama e comédia “O Calendário da Morte”.
Já, em meados da década de 1990, quando essa tentativa de se sagrar como autor já não tinha dado muito certo, ele entregou este roteiro, bem mais austero que esses outros citados, em parte, também, pela solene abordagem de um fato real: “Vivos” reconstitui a verídica história na qual uma equipe uruguaia de rugby tem seu avião avariado na cordilheira dos Andes.
Esse acidente aéreo, que inicia o filme –cujo acabamento técnico, ostensivo no que tange aos efeitos digitais da época, já busca superar a versão cinematográfica anterior “Os Sobreviventes dos Andes”, de 1976 –logo é precedido pelo habitual drama pós-catástrofe do qual filmes de náufragos ou de sobreviventes em geral se sustentam: Os dias que se seguem amplificam a angústia, ressaltada pela presença dos cadáveres daqueles que morreram no acidente, ou mesmo dos feridos e moribundos que foram perdendo a vida depois. Não há comida (o quê dá à perspectiva de vida um curto e alarmante prazo), não há aquecimento e o frio é extremo (impedindo até mesmo a decomposição dos mortos).
A espera por resgate se estende indefinidamente –eles avistaram um avião sobrevoando os picos e tiveram a impressão de terem sido vistos –porém, os meses se passam sem que qualquer ajuda apareça.
Quando a fome e a inanição ameaçam começar a matar aqueles que não morreram pelo acidente, pelos ferimentos e pelo frio, o jogador Nando Parrado (Ethan Hawke) tem a controversa idéia de usarem os corpos mortos (empilhados ao lado da carcaça do avião) para se alimentar. Trocando em miúdos: Praticar canibalismo para não morrer.
Sem grandes arroubos inventivos, o diretor Frank Marshall (produtor que já havia se aventura na direção em “Aracnofobia”) tenta dar um viés excessivamente comercial e acessível ao filme; as cenas de canibalismo, por exemplo, são quase um caso de bipolaridade narrativa: Ao mesmo tempo querem passar uma atmosfera de despojamento e naturalismo, e ser um registro asséptico que não machuque a sensibilidade do expectador.
É essa indefinição –mantida do início ao fim –que impede “Vivos” de ser uma obra realmente marcante.

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