Curioso notar que, como diretor, Ben Stiller
soube enfatizar suas capacidades interpretativas muito melhor do que outros
realizadores com os quais trabalhou. Claro que os Irmãos Farrelly, em filmes
como “Quem Vai Ficar Com Mary?” souberam tirar imenso proveito de seu timing
cômico, mas tanto em “Trovão Tropical” como neste “A Vida Secreta de Walter
Mitty”, Stiller não somente faz ótimo uso de seus dotes de comédia como também
de sua versatilidade como ator dramático –e nesse sentido, seu trabalho é muito
mais eficiente do que Noah Baumbach, por exemplo, conseguiu obter dele em
“Enquanto Somos Jovens”.
“Walter Mitty”, de fato, se equilibra numa
linha tênue e agridoce entre comédia e drama. Seu personagem-título, vivido
pelo próprio Stiller, é um sonhador compulsivo. Resignado a um escuro e pouco valorizado
escritório de negativos da revista “Life”, Walter Mitty contorna a mediocridade
de sua vida com lapsos ocasionais onde se imagina mudando sua realidade e
fazendo coisas extraordinárias, o que inclui atrever-se a abordar a nova
funcionária da empresa, a interessantíssima Cheryl (Kristen Wiig, mais contida
que o normal e, talvez por isso, encantadora).
Na realidade, porém, Walter sequer reúne
coragem para falar com ela, ou para confrontar o detestável diretor de
transição (Adam Scott) que enviaram para realizar uma reestruturação interna na
revista.
A “Life” terá, segundo ele, sua última edição
impressa. E a foto escolhida para a capa é de um negativo específico, o nº 25,
enviado ao escritório de Walter pelo prestigiado fotógrafo Sean O’ Connel (Sean
Penn, escolhido por Stiller especialmente para o papel). Mas, o envelope
recebido não possui exatamente o nº 25 (salta do 24 para o 26!), e Walter deve
encontrá-lo se deseja manter seu emprego nesse período de transição.
Ele decide então deixar de lado os sonhos e
imaginações e partir pelo mundo à procura de O’ Connel –um desses aventureiros
à moda antiga cujo paradeiro é sempre um pouco difícil de definir –o quê o leva
à Groenlândia, à Islândia e depois ao Himalaia; e, principalmente, o leva
também a uma viagem interior de descoberta onde reencontra sua própria coragem,
auto-estima e iniciativa.
Integrante daquele sempre apreciado sub-gênero
dos filmes ‘feel good’, “Walter Mitty” é construído tanto para passar uma
positiva e edificante mensagem ao expectador (que no caso seria a de parar de
perder tempo com sonhos e planos e por em prática seus objetivos, correndo
atrás deles) como também deixá-lo extasiado: E nesse sentido, Stiller caprichou
na concepção visual de seu filme, seja nos exuberantes cenários naturais que
registra, seja nas sequências inesperadas de ‘sonhos’ com uso inventivo de
efeitos visuais: Elas vão desde o fantasiosamente escancarado (Walter e o
diretor de transição saem no braço no melhor estilo ‘anime japonês’!) e o
romanticamente implausível (Walter se imagina como um bizarro e sedutor
alpinista latino!) até o assumidamente engraçado (a referência hilária à “O Curioso Caso de Benjamin Button”).
Como em “Trovão Tropical”, esse excesso de zelo
estético pode até depor contra os argumentos acerca do real talento de Stiller
como diretor, mas não há como negar que ele fez um filme encantador e
fascinante.
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