O título original, “Non Si Sevizia Un
Paperino”, na lógica algo lisérgica que o ‘giallo’ mantinha, diz respeito ao
personagem do Pato Donald (?), que surge como um dado fundamental no desenlace.
Sua protagonista, a deslumbrante Barbara
Bouchet –cuja primeira aparição se dá sem roupas a provocar a libido precoce de
um garotinho de uns 12 anos (!) –vive uma dessas personagens investigadoras
casuais, uma aura de empenho e ingenuidade a lembrar os personagens do desenho
“Scooby-Doo” (!). Este é, contudo, o único vestígio de ingenuidade no filme de
Lucio Fulci, tão pontuado de malícia e vulgaridade, como parecia ser regra
entre os exemplares daquele sub-gênero.
O que destaca “O Segredo do Bosque dos Sonhos”,
no entanto, é a inventividade de Fulci na condução do enredo, sua capacidade de
desviar a atenção do expectador para o cerne devido de sua narrativa, e sua
desenvoltura natural para com cenas de incontornável apelo macabro.
A produção é sensacionalista e rudimentar, como
é inerente ao ‘giallo’, entretanto, a experiência de Fulci encontra meios de
contornar essas facetas: Ele especula as muitas variações provincianas da
região de Centura, saboreando com calma e satisfação os elementos da trama de
suspense que constrói.
Leva um certo tempo até para que o primeiro
assassinato ocorra.
E a descoberta disso, e da existência de um
serial-killer naquele lugarejo é pontuada por redundância típicas de
autoridades e habitantes de lugares pequenos cuja mentalidade fechada –e
eventuais trapalhadas –interferem na investigação, ajudando o assassino.
Há o garoto sequestrado cujo suposto
sequestrador, preso logo depois, se revela de uma inaptidão lamentável –não
poderia ser ele autor da terrível morte que se constatou na sequência: O menino
é encontrado morto.
A partir daí, em meio às investigações de praxe
–pontuadas mais por bravatas dos investigadores do que por avanços de fato
–Fulci parece interessado em plantar pistas falsas, como os suspeitos na forma
da pretensa feiticeira interpretada por Florinda Bolkan, ou até mesmo a
personagem cosmopolita e ex-viciada de Barbara Bouchet –que somente a partir de
um determinado ponto será mostrada como a protagonista de fato.
Demanda um tempo considerável para Fulci ceder
à convenção e reconhecer o astuto jornalista de Tomas Milian (o “Tepepa” em
pessoa) como um dos personagens principais.
Uma analogia estranhamente comum entre o
processo macabro da elucidação de uma série de crimes hediondos e o gradual
êxtase provocativo e libidinoso.
Não à toa, as cenas de gore (até contidas para
os padrões de Fulci) são trabalhadas com a mesma lascívia que as cenas de nudez
de Barbara.
É o ‘giallo’ assimilando algumas lições
implícitas do mestre Hitchcock, e colocando-as em prática com uma percepção
muito mais exacerbada (proporcionada pela volatilidade artística dos anos 1970)
com a qual o próprio mestre jamais sonhou.
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