O filme dirigido por Michael Radford (de “O
Carteiro e O Poeta”), adaptado do clássico de George Orwell, embora careça de
alguma sutileza narrativa, é um trabalho belíssimo e cheio de propriedades.
E oportuno: Foi lançado exatamente no ano de
1984, o que acentua a característica de ‘distopia alternativa’ idealizada por
Orwell, não porém sua capacidade de previsão –o Grande Irmão, ao qual a trama e
os personagens se referem com frequência concedendo-lhe onipresença na
narrativa, é uma alegoria tão perfeita do controle tecnológico gradualmente
exercido sobre o cidadão comum pelo estado autocrata que está hoje impregnado
na cultura pop; e muitos são os que relacionam esse termo mais ao reality show
“Big Brother” do que à obra de George Orwell.
Assim sendo, no mundo paralelo em que se passa
o enredo imaginado pela mente metódica e inquieta de Orwell, a Inglaterra é um
local onde se cultivam catatônicos.
Para o Estado, os indivíduos que formam a massa
comum devem ser esmagados por um conjunto opressor de regras que não fornecem
outras opções senão ser um mero operário sem distinção dos demais. E o
protagonista Winston (John Hurt, fantástico) não é, deveras, nada mais que
isso.
Na sociedade em que vive, emoções e sensações
mais extremas são tolhidas e proibidas. Fazer sexo –ou mesmo expressar alguma
sexualidade –é ilegal. Pensamentos fora do padrão resignado são considerados
prontamente subversivos.
E o Grande Irmão tudo vê e tudo sabe.
Um misto de Fuhrer, divindade e popstar, o
Grande Irmão é o único elemento desse mundo que os cidadãos têm autorização
para venerar –e, por conta disso, as sessões de enaltecimento a ele mostram um
assustador extravasamento de energia reprimida.
É a jovem Julia (Suzanna Hamilton) quem dará à
trajetória de Winston um rumo diferente da de tantos outros homens sufocados
pelo controle: A partir de um afeto que se inicia aos poucos, eles logo iniciam
encontros fortuitos que não apenas flertam com a inédita excitação do proibido,
como também os levam a refugiar-se em áreas terminantemente interditadas devido
à histórias de guerra que seu governo contou; e sua presença lá faz Winston
então notar que tais histórias começam a mostrar-se distantes da realidade
verdadeira.
Como é inerente à Orwell, a liberdade (ou o
vislumbre da liberdade) cobra um preço –e, não tarda para que Winston e Julia
caiam nas garras do homem de confiança do Grande Irmão, o implacável O’ Brien
(que Richard Burton interpreta com uma peculiaridade magnética), e sejam submetidos
a ele para que tenham sua integridade física e psicológica virada do avesso
até, por fim cederem.
Narrando com elegância à toda prova a adaptação
cinematográfica de um dos mais primorosos textos do século XX, o diretor Radford moldou um tratado sobre a sordidez mortífera da autocracia cujo mérito é
alarmar tanto quanto seu famoso livro original.
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