Na primeira vez que assisti “Capitão Kronos”
ele não me desceu muito bem: Não consegui comprar sua premissa, não me envolvi
por sua narrativa, a postura do protagonista me soou prepotente e sem carisma e
seu visual frio e verdejante –algo meio contraditório num filme de vampiros –me
pareceu pouco adequado.
Na segunda vez todas essas coisas deixaram de
importar: Como alguns notórios cult movies, “Capitão Kronos” cresce, e muito,
em uma revisão; os detalhes em torno de sua história –e do que, de fato, ela
irá se constituir –vão chegando aos poucos, exigindo relativa paciência do
expectador; o trabalho de direção de Brian Clemens (roteirista do cult “Mil
Séculos Antes de Cristo”) não planeja conquistar o público de imediato (ele dispõe
suas peças com parcimônia); o Capitão Kronos, vivido com altivez e fleuma por
Horst Janson, é um herói marrento e taciturno, cujas motivações vão sendo
desvendadas a medida que a trama caminha; e a ambientação rural oferece o
lúdico na sua primeira metade, para intoxicá-lo com o macabro no seu rumo ao
clímax.
Basicamente, acompanhamos lado a lado a
trajetória do já constituído e inabalável personagem principal, Capitão Kronos,
bravo soldado das tropas imperiais (que eu julgo ser da Inglaterra) que, finda
a guerra, se dedica assim à outra batalha: Junto de seu auxiliar corcunda Grost
(John Cater, de “O Abominável Dr. Phibes”), que faz as vezes de cérebro
enquanto ele é os músculos, Kronos singra a Europa Medieval à caça de vampiros,
criaturas tão perigosas quanto melindrosas cujo conhecimento profundo é
necessário para saber como identificá-los e de que jeito matá-los.
No seu percurso, Kronos salva da guilhotina uma
camponesa acusada injustamente de heresia, Carla (a bela Caroline Munro, de
“007-O Espião Que Me Amava”), que junta-se à sua comitiva. Carla é, assim, os
olhos do público: É ela quem obtém as respostas mais razoáveis que oferecem um
mínimo de textura do protagonista, de seu passado e da metodologia de sua
tarefa –todas as outras explicações mais surgem, quando muito, em meio às cenas
transcorridas num trabalho curioso que mescla o desenvolvimento ao avanço
folhetinesco. Pois, “Capitão Kronos” lança mão de diversos personagens, uns
plantados para gerar pistas falsas no esclarecimento das intrigas, outros para
fazer volume à narrativa de tensão.
No vilarejo para onde segue, Kronos vai atender
ao chamado de um velho amigo, Dr. Marcus (John Carson), aflito com curiosos
ataques às jovens camponesas da região que subitamente aparecem fracas e
envelhecidas (!). Kronos e Grost dão de pronto o diagnóstico: É um vampiro!
Quem ele é (dentre tantos moradores
potencialmente suspeitos) e como pegá-lo é a questão.
E o filme de Clemens ampara-se justamente
nisso: No suspense oriundo da pura exaltação do clima, nos inúmeros suspeitos
que vão se enfileirando com suas próprias sub-tramas, e nas pistas (falsas ou
não) com as quais os protagonistas trabalham, em meio às descobertas das quais
o filme vai avançando.
“Capitão Kronos” foi um filme incompreendido em
sua época. Embora bem realizado, bem conduzido e, no fim das contas, seja de
fato um grande filme, o diretor Clemens opta por uma evocação do estilo
tradicional dos filmes da produtora Hammer de duas décadas atrás (o que
certamente não fez o gosto das plateias mais novas de então); além disso, ele
entrega um filme de vampiro atípico, onde durante a maior parte do tempo,
roteiro e direção se dedicam menos aos chupadores de sangue propriamente ditos
e muito mais à contextualização do herói, sua relação com Carla (que progride
para um romance), sua interação divertida com Grost, sua amizade com Marcus e a
maneira com que se impõe aos aldeões e aos contratempos que aparecem. A ameaça
vampira, por assim dizer, e seu background (de onde vieram, quem são e por que
fazem aquilo que fazem) é um mistério que permanece omisso no filme pelo menos
até seu apoteótico desfecho.
Pode não ter encontrado seu
público justamente por conta dessa originalidade revisionista para com os códigos
de seu gênero, mas, não há como negar que o resultado é, em si, cheio de
predicados e de qualidade.
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