sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Fernão Capelo Gaivota

 


Embora tivesse sido uma época de ebuliente experimentação artística e temática, os anos 1970 não eram um período no qual arroubos técnicos tiveram tanto espaço –se desconsiderarmos as inovações de “Star Wars”, é claro –daí o fato de ser tão festejada esta realização técnica (unicamente interpretada por animais), adaptada pelo diretor Hall Bartlett do famoso livro filosófico de Richard Bach.

Sem indícios de humanos por perto, o trabalho de Bartlett tem como ‘elenco’ várias gaivotas que ganham as vozes em ‘off’ de atores (James Franciscus; Juliet Mills, de “Avanti!”; Philip Ahn; Dorothy McGuire) a fim de expressar os pensamentos animais –também a narrativa recebe o acréscimo das canções de Neil Diamond que, em sua melodia e melancolia, traduzem algumas impressões acerca do tom reproduzido no livro (não à toa, o filme conquistou o Globo de Ouro de Melhor Trilha Sonora).

Apesar de tudo, é inescapável a sensação de estranhamento quando acompanhamos um grupo de gaivotas vivendo pelos mares sempre regido pelas mesmas leis de buscar constantemente comida.

Um deles, entretanto, chamado Fernão Capelo ignora a própria fome para dedicar-se ao que realmente deseja: Voar cada vez mais alto, almejando assim uma espécie de grandeza por meio desse objetivo alcançado.

Se as demais gaivotas contentam-se em planar rente ao chão, Fernão quer flertar com o perigo nas maiores altitudes, fazer valer as asas que a natureza lhe deu, ignorando a fome que lhe desatina as entranhas para obter uma conquista de ordem mais abstrata e existencial.

No entanto, crentes de que essa não é sua natureza, as demais gaivotas o repudiam, e ele é banido, ganhando os céus intermináveis do mundo para voar.

Em seu percurso, Fernão encontra outras gaivotas também desgarradas. Algumas trazem respostas a suas perguntas, outras são como aprendizes que, em sua mentoria, também fornecem meios do próprio Fernão descobrir mais.

Como no livro, em algum momento, a reflexão existencialista embutida no texto vai além do raciocínio de alguns expectadores, vislumbrando improbabilidades que exigem demais da narrativa.

Embora nunca desagradável, feio, ou desleixado, o trabalho de Bartlett mostra-se difícil para o público de hoje. Seu ritmo lento e contemplativo, bem como as soluções de natureza ambígua da trama podem deixar os expectadores desamparados.

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