terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Asparagus


 Toda experimental, esta animação em curta-metragem reflete bem as predisposições lisérgicas e psicodélicas de muitos jovens realizadores da época –anos 1970 –que com frequência recorriam à liberdade e à autonomia da animação para materializar suas inquietações surreais, insólitas e oníricas diante da impossibilidade de levantar recursos para um filme em live-action que albergasse ideias tão mirabolantes; embora tivessem, sim, havido alguns casos de filmes com atores que ganharam a luz do sol.

Não há um fio narrativo lúcido nos imponderáveis dezoito minutos de duração de “Asparagus”: Ele se inicia da forma mais desconcertante possível quando vemos o que parece ser sua personagem protagonista –uma mulher num apartamento, sem o rosto devidamente esboçado ou definido –ir até o banheiro e defecar (!). suas fezes, que na verdade são os vegetais que dão nome ao filme (um objeto recorrente nos delírios visuais que se seguirão), formam o título (!) e o filme assim começa.

Tudo parecer ser um devaneio da parte de sua personagem principal; ela vai à janela e imagens de um delírio inapreensível transcorrem lá fora. Em seguida, após outras cenas nebulosas, tortuosas e enigmáticas, a vemos num grande salão de ópera, onde uma multidão assiste a um espetáculo algo indescritível –transcorrem no palco elementos imprecisos e incertos a compor formas abstratas sem qualquer especificação. A protagonista se esgueira até os bastidores apenas para flagrar as facetas frustrantes da ilusão e em seguida volta para casa.

Lá, mais uma bateria de delírios eróticos envolvendo os tais asparagus se sucedem, e ela pratica o que parece ser sexo oral num desses objetos fálicos –ao longo dessa felação, manifestações diversas do que pode ser o sexo, a prostituição e a compulsão, em suas mais variadas consequências dentro da sociedade surgem saídas de sua boca; lembrando que essa personagem não possui nem olhos nem nariz, sendo portanto destituída de expressões humanas.

A estranheza é o objetivo principal de “Asparagus”, não resta dúvidas –e esta é uma das poucas certezas que ele oferece ao público –e para tanto não é de surpreender que autores como David Lynch enxerguem nele uma fonte visceral e inesgotável de influência criativa.

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