sexta-feira, 25 de junho de 2021

Adorável Pecadora


 Realizado depois de “Quanto Mais Quente Melhor” e logo antes de “Os Desajustados” –o último filme de Marilyn Monroe –este “Adorável Pecadora” pertence à fase em que ela já era uma estrela consolidada e absoluta; e para tanto é quase inevitável que os propósitos do filme e os interesses do público girem em torno dela, ainda que na obra original (“Avenida dos Milhões”, de 1937, do qual este é uma refilmagem) a mesma personagem tivesse menos estatura e expressão.

Marilyn desestabiliza o filme com seu carisma. Quando ela está em cena, incita uma irresistível vontade de ignorar os demais personagens –inclusive seu protagonista –de deixar de lado a compenetração para com a trama (toda divertidamente rocambolesca) e de sequer prestar atenção às falas. A câmera se apaixona por ela: Temos vontade de procurá-la no enquadramento quando ela não está presente; nos fixamos com fascínio inesgotável quando ela está.

Habilidoso, o diretor George Cukor faz o que pode para harmonizar o filme que tem em mãos, a despeito da presença singular de sua estrela, pois, antes de Marilyn, quem protagoniza “Adorável Pecadora” é, na verdade, o francês Yves Montand no papel do mulherengo e milionário Jean-Marc Clemént –personagem este cujo divertido histórico de enriquecimento familiar é narrado no prólogo.

E Yves Montand até que funciona bem: Aparenta ser, no início, um protagonista sisudo e sem atrativos com seu rosto marcado e sério –característica potencializada pelo forte sotaque francês –mas, quando seus dotes cômicos logo entram em cena, esses elementos promovem uma grata surpresa ao expectador.

Ao descobrir que sua alardeada fama de playboy servirá de tema à uma paródia num espetáculo teatral off-Broadway, Jean-Marc tem a ideia de comparecer aos ensaios para amenizar a má publicidade. Lá, acaba arrebatado por uma aparição: Mandy Dell, personagem de Marilyn Monroe, surge em meio à um ensaio, encantando o milionário (e a plateia junto) com seu misto inigualável de formosura, magnetismo e sex-appeal.

Fazendo-se passar por mais um dos imitadores de Jean-Marc Clemént (dentre os muitos que perambulavam por ali), o milionário aborda a moça, convencendo-a de que é mais um dos muitos atores empobrecidos atrás de um lugar ao sol. Apaixonado, ele decide manter a farsa ao perceber que seus milhões dificilmente haverão de conquistar aquela garota avessa à adulação dos ricos.

Ele se dispõe a conquistá-la usando apenas de seu charme, mas descobre, nos dias que se seguem, que isso não é nada fácil: Mandy tem certa proximidade com Tony Danton (Frankie Vaughan), astro do show, e os gerenciadores do teatro não o deixam em paz. A saída é valer-se indiretamente da riqueza: Jean-Marc compra o próprio teatro fazendo com que seu braço-direito, George (Wilfrid Hyde-White), torne-se o principal investidor da peça –exigindo assim, seu destaque nela –e ainda contrata o humorista Milton Berle, para ensiná-lo a ser engraçado, Bing Crosby, para torná-lo um prodigioso cantor, e Gene Kelly, para fazer dele um hábil dançarino –todos eles em fabulosas participações especiais não-creditadas!

“Adorável Pecadora” se sustenta, pois, numa farsa romântica, na qual o personagem principal deve manter certo disfarce ante seu objeto do desejo, uma vez que para conquistá-la deve fazer de tudo, exceto contar a verdade. É uma premissa graciosa e funcional, que já rendeu (e renderia) incontáveis filmes, dos mais diversos e divertidos; e não haveria de ser um competente profissional como George Cukor que não faria um bom trabalho com ela. Nessa proposta, “Adorável Pecadora” entrete e envolve do início ao fim, a despeito de todas as complicações notórias que suas filmagens atravessaram –paralisação devido a uma greve dos atores e roteiristas, mudanças no roteiro promovidas por Arthur Miller, o marido de Marilyn Monroe, para que fosse ampliado o personagem de Mandy Dell, e o controverso romance extraconjugal que envolveu o astro Yves Montand (casado com Simone Signoret) e a própria Marilyn.

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