terça-feira, 21 de janeiro de 2025

A Letra Escarlate


 Em tempos em que Demi Moore é sondada para a ganhar o Oscar de Melhor Atriz pelo surpreendente “A Substância”, vamos voltar numa época em que muitos acreditam que isso era algo impossível de se acontecer, mais precisamente no ano de 1995, quando do lançamento do drama “A Letra Escarlate” que veio acompanhado junto de uma campanha para levá-la ao Oscar. O que terminou resultando em ainda mais chacota em relação aos dotes dramáticos de Demi como atriz –por aqueles anos, ela viu, paralelo ao crescimento de seu status como estrela de cinema, as indicações a si mesma como Pior Atriz do Ano no Framboesa de Ouro se multiplicarem.

É verdade que o filme também não ajuda muito: A cena inicial (uma reunião de índios para uma espécie de cortejo fúnebre) já deixa bem claro as propensões do diretor Roland Joffé (que dirigiu “A Missão”, um hábil retrato do conflito indígena) para inserir mais aventura no texto todo drama e folhetim extraído do romance literário de Nathaniel Hawthorne (já adaptado para cinema, inclusive, por Win Wenders, e muito homenageado na comédia “A Mentira”). Na Nova Inglaterra, um vilarejo na América ocupado por uma comunidade de imigrantes ingleses recebe entre seus recém-chegados Esther Prynne (Demi Moore), enviada por seu marido, Roger Prynne, para que, antes de sua chegada, comece os preparativos para arrumar a casa em que irão viver.

Logo de cara, Esther demonstra iniciativa e independência que alarmam os mandatários locais, homens religiosos de rígido código moral para os quais o papel da mulher, em sociedade, deve vir cercado por regras de opressão. Com o tempo, Esther –que casou-se ainda bem nova, com um homem mais velho –torna-se amiga do pastor Arthur Dimmesdale (Gary Oldman), por quem acaba, mais tarde, se apaixonando.

Ator tão talentoso quanto generoso, Oldman já era calejado em papéis de vilão naquele período (havia feito, além de “Drácula de Bram Stoker”, também “O Profissional” e “O Quinto Elemento”), o que faz de sua escolha para o papel de galã romântico uma alternativa bastante curiosa –e um dos poucos lampejos inspirados do filme.

Enamorados um pelo outro, Arthur e Esther têm uma fortuita noite de amor quando acreditam que o marido de Esther, Roger (interpretado, à propósito, por Robert Duvall), foi morto num ataque de índios à sua embarcação. Na verdade, Roger terminou prisioneiro dos selvagens que o mantêm cativo por um tempo; quando ele, entre um e outro surto de loucura, começa a absorver alguns de seus costumes.

Quanto à Esther, ela engravida e, quando esse fato se torna óbvio para a comunidade (evidenciando também o adultério que ela cometeu), os senhores locais exigem que ela revele a identidade de seu amante, a fim de enforcá-lo. Esther guarda segredo para poupar a vida de Arthur, mas acaba vítima das consequências: Nos meses que se seguem, ela é aprisionada (acaba sendo solta apenas quando, por fim, dá à luz a uma menina, de nome Pearl), e quando ganha a autorização para voltar para casa e cuidar da filha, ela tem uma letra ‘A’ escarlate costurada às suas roupas –a indicação e a constante lembrança de que ela foi adúltera e, por isso, deve sofrer retaliação moral da comunidade, para onde quer que vá.

Ao melodrama clássico, esboçado com pompa e circunstância no livro original –e que foi relativamente assim mantido em outras adaptações mais ou menos bem sucedidas do material –o diretor Roland Joffé acrescenta doses de paranóia e suspense (quando Roger, mais vilanesco do que nunca, regressa dos mortos e, munido de outra identidade, promove uma ‘caça às bruxas’ na aldeia a fim de descobrir  quem foi o homem misterioso com quem Esther envolveu-se), além de, ao fim, até um pouco de ação (quando os índios, mostrados naquele início, decidem invadir a aldeia dando um golpe de misericórdia nas sandices generalizadas dos homens brancos)! Nada disso, porém consegue extrair seu filme de uma certa apatia –na verdade, até piora um pouco as coisas: Tantas são as desventuras a abater-se sobre sua sofrida protagonista, e tão esmerado é o esforço dos realizadores para torná-los uma penitência sem fim, que o papel de amante misterioso resguardado ao omisso Arthur termina fazendo-o parecer um tremendo idiota na maior parte do tempo –o que, claro, depõe terrivelmente contra o romance que, em inúmeras momentos (sobretudo, na inserção quase onipresente da melosa trilha sonora de John Barry), este filme parece querer ser.

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