Primeiro filme realizado pelas Irmãs Wachowski –algo como um experimento do estúdio, a fim de avaliar se eram capazes de fazer um filme antes de viabilizar o orçamento para seu mais ambicioso projeto, um certo épico de ficção científica chamado “Matrix”... –“Bound” possui obviamente uma economia de recursos que define este tipo de realização, no entanto, cumpre seu papel ao exibir uma dupla de diretores (ou melhor, diretoras) em pleno domínio de ritmo e clima de sua narrativa numa obra esperta, original e equilibrada que une elementos noir com um inconformismo pós-moderno que muito remete ao cinema dos Irmãos Coen: Em suma, uma produção indicativa de talentos promissores.
Numa proposta bastante arrojada para a época
(anos 1990), mas que hoje tornou-se um bocado lugar comum em muitas produções
de cinema e TV, a trama de “Bound”, embora flerte com expedientes de gênero
prontamente reconhecíveis como o já mencionado suspense noir e o filme de gangster, tem a audácia de centralizar esses
elementos ao redor de um casal de lésbicas (!). Assim como no brilhante “A Criada”, realizado décadas depois, a trama que se desenvolve a partir de
alianças, mentiras e traições características de um filme dos anos 1950 e 60
(que parece fascinar seus realizadores) traz não um homem e uma mulher
(inescapavelmente uma femme fatale)
às voltas com intrigas das quais precisam se safar para escapar juntos e com
vida, mas, na verdade, duas mulheres!
Os pivôs dessa inusitada intriga (de novo,
inusitada para a época) são Corky (vivida por Gina Gershon, de “Showgirls”) e
Violet (vivida por Jennifer Tilly, de “A Fuga” que, dois anos antes, havia sido
indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por “Tiros Na Broadway”, de Woody
Allen). Recém-saída da penitenciária, Corky, sempre marrenta e arredia, arruma
emprego como encanadora de um prédio do subúrbio caindo aos pedaços –palco para
o desenrolar de toda a trama. Tal prédio, serve de moradia provisória para o
casal Caesar (Joe Pantoliano) e Violet (a autêntica femme fatale do filme), e para os eventuais encontros que ele, um
capanga contratado da máfia, tem com os gangsteres que pagam seus serviços.
Desprezadas pelos obtusos personagens
masculinos, atentas e cientes a todos os desdobramentos pela força das
circunstâncias (Corky, é encanadora e, por isso, está sempre ouvindo as
negociações que se sucedem nos apartamentos ao lado; enquanto, Violet, no
subestimado papel de esposa-troféu, fica por dentro de todas as conversas,
alianças e traições das quais participa o marido), as duas pouco a pouco criam
um laço afetivo –que descamba, pelo menos em uma cena, para um tórrido
interlúdio sexual! –e descobrem que Caesar tem planos de trair seus chefões
empregadores, incriminá-los e fugir com seu dinheiro debaixo do braço. Uma vez
formando um casal, Corky e Violet têm agora um plano, digamos, paralelo:
Ludibriar Caesar em sua traição contra os chefões, e enganar a todos, deixando
os homens para trás e fugindo com o dinheiro.
No entanto, é com assassinos sem escrúpulos que
as duas estão lidando, e escapar de sua retaliação, caso sejam desmascaradas,
será algo que nem toda a esperteza do mundo poderá fazer por elas.
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