sábado, 15 de abril de 2017

O Profissional

Após firmar-se como um inovador da estética cinematográfica na França dos anos 1980 com alguns dos mais desiguais títulos de sua filmografia, a carreira de Luc Besson passou por algumas mudanças. Reviravoltas das quais, de uma certa maneira, ele até hoje está se recuperando.
Na década seguinte, por volta de 1994, ele migrou para os EUA, onde a variedade de recursos técnicos e orçamentos mais generosos prometiam uma sucessão de filmes dos mais interessantes.
Ao menos os primeiros que ele fez, “O Profissional” e “O Quinto Elemento” de fato eram.
É sobre esse primeiro que irei falar hoje.
Na opinião de muitos, uma adaptação velada e disfarçada de “Ranxerox” –uma HQ européia anárquica e alternativa que mostra um enorme e truculento ciborgue servindo como namorado postiço a uma ninfeta rebelde, exatamente o tipo de material que inspirava e influenciava muito de sua obra da França –o filme segue os passos do assassino profissional Leon (Jean Reno, colaborador de Besson), cujo modo de vida evita que se envolva com outras pessoas, incluindo seus barulhentos vizinhos, uma família entre os quais está a articulada e precoce menina Mathilda (Natalie Portman, bem novinha estreando no cinema e simplesmente matando a pau!).
O quê Leon não sabe é que o pai da menina tem negócios extremamente escusos com policiais corruptos, e o líder deles (vivido por um surtado Gary Oldman) não tardará a aparecer no apartamento para cobrar uma dívida. Com sangue.
A cena que engatilha a dinâmica dos personagens de Portman e Reno –e que responde pelo centro emocional e narrativo do filme –é um exemplo da capacidade inata de Besson em articular expressões intimistas e dramáticas para fazê-las funcionar inesperadamente num filme de ação: A menina por acaso vai ao mercado fazer compras enquanto os vilões promovem uma chacina entre seus parentes, mas, quando ela volta, para escapar, encena uma tentativa de entrar no apartamento do lado, o de Leon.
Uma cena que descrita pode parecer banal, mas na qual o diretor vale-se de uma série de ângulos e cortes para tornar antológica.
A partir daí, tornado praticamente um tutor da jovem o anti-social Leon tenta fazer o quê pode: Ensina para ela seu ofício (sim, o de matador de aluguel), tenta controlar seu ímpeto de vingar sua família e desvencilhar-se, na medida do possível, de suas insinuações (!).
Uma característica muito interessante de “O Profissional” –e que certamente Besson trouxe de “Ranxerox”, além de evidenciar, como realizador, sua pouca predisposição em acatar o politicamente correto de Hollywood, mesmo estando trabalhando por lá –é o subtexto sexual (ainda que bastante sutil), no qual a menina, uma garotinha de uns 12 anos, apresenta-se com sedução: E a jovem Natalie Portman tira de letra as cenas em que sua personagem exibe sua sexualidade (sinto muito, Dominic Swain, mas ela sim foi a mais perfeita Lolita a aparecer nas telas naqueles anos!).
Besson não esquece, contudo, que este é um filme de ação, e essa intrigante dinâmica que surgem entre Leon e Mathilda (a menina que seduz o homem feito para obter dele o objetivo ilícito que deseja) emoldura magnificamente bem as seqüências de ação e perseguição que surgem –e que se intensificam em sua excelente meia hora final –dando ao filme um incomum peso dramático.
Uma bela e original estréia em terras americanas.

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