domingo, 13 de dezembro de 2015

Jean de Florette / A Vingança de Manon

"Jean de Florette" foi lançado em meados de 1985 nos cinemas, e sua continuação, "A Vingança de Manon", chegou seis meses depois. 
Caso assim, “De Volta Para o Futuro 2” e “3” só viriam a fazer uns cinco anos mais tarde, “Matrix Reloaded” e “Revolutions”, só em 2003, vinte e oito anos depois! São os franceses antecipando-se aos americanos naquilo que supostamente eles fazem melhor: cinema comercial.
Ainda que seja injusto e redundante dizer que estes dois belíssimos filmes sejam obras de orientação especialmente comerciais. 
Eles também o são (e o sucesso que fizeram ratifica isso), mas são também primorosas obras da mais pura arte cinematográfico, exemplos magistrais do auge técnico do diretor Claude Berri, que começa sua sucessão espantosa de escolhas acertadas, dividindo a trama concebida por Marcel Pagnol, no formato original de duologia. 
Assim sendo, no primeiro, acompanhamos a trajetória da família Soubeyran, que resume-se então ao carrancudo tio (Yves Montand, meticuloso) e seu sobrinho, Ugolin (Daneil Auteuil, esmerado numa caracterização a um só tempo asquerosa e emotiva), este regressando da guerra com uma novidade com a qual pretende prosperar: Mudas de flores raras, que dependem de muita água para serem cultivadas naquela região.
Contudo, a única água disponível vem de uma nascente localizada num terreno cujo herdeiro, Jean de Florette (Gerard Depardieu, intenso e soberbo), não venderá por nada, por uma razão bem específica: Vindo da cidade, o sonhador Jean deseja, para sua esposa e filha, um vida tranqüila no campo, cheia daquela beleza que só o contato com a natureza poderá proporcionar. 
De olho no terreno, e em sua preciosa nascente, Ugolin e seu tio armam intrigas e maldades que visam desiludir Jean, e fazê-lo vender seu terreno (eles chegam a cimentar a nascente, para que Jean tenha enormes transtornos para adquirir água, imaginando que trabalha num terreno árido). E as cenas maravilhosas construídas pelo diretor Claude Berri são de um preciosismo técnico, ao mesmo tempo que revelam-se incrivelmente poéticas.
A narrativa de Claude Berry, ainda que devotada às orientações clássicas, evoca uma quase experiência sensorial ao registrar os percalços doloridos de Jean em busca da água da sisterna; as maquinações cheias de maldade e uma vilania desconcertantemente humana de Ugolin e seu tio; os percalços gradativamente frustrantes flagradas na fazenda de Jean que paulatinamente minam seus sonhos (e os substituem por uma inclinação ao alcoolismo) e geram uma sensação de aridez e sede.
Após o fim amargo do primeiro filme, o segundo avança alguns anos no tempo. Sem Jean, os Soubeyran conseguiram o terreno para si, e valeram-se da água da nascente para prosperar e enriquecer.
Ao contrário de sua mãe, porém, a menina Manon, filha de Jean, continuou morando por lá, no humilde trabalho de pastora de cabras. O anos que se passaram transformaram-na em uma bela mulher (e isso é poderosamente ilustrado nas curvas estonteantes da linda Emmanuelle Béart), o quê não passa despercebido de Ugolin que, mesmo diante da diferença visível de idade e, digamos, incompatibilidade, acaba apaixonando-se por ela. 
Mas, Manon sabe que os Soubeyran foram os responsáveis por tudo o que prejudicou sua família, assim como o são indiretamente todos os moradores daquela região de Provença. Ao encontrar a nascente principal, que leva a preciosa água à todos da região, ela tem enfim uma oportunidade de vingar-se, e no processo, elucidar um terrível segredo.
Nesta primorosa segunda parte, a narrativa de Claude Berri (que já se revelava brilhante) tem a oportunidade de unir suas pontas aparentemente soltas num arremate esplêndido, conduzindo à uma solidez magnífica um trabalho que já se mostrava cheio de insuspeitas qualidades.
Um pena estes dois trabalhos hiperlativos serem tão desconhecidos do público em geral: São, tranquilamente, alguns dos melhores filmes franceses de toda a história do cinema.

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