Dificilmente você verá um grande diretor
valer-se do recurso do found footage (aquele no qual a câmera de mão, manuseada
por um dos personagens da trama acaba sendo o próprio filme em si). Martin
Scorsese. Roman Polanski. Steven Spielberg. Ou mesmo os mais novos como
Christopher Nolan, dificilmente empregarão esse artifício em suas narrativas.
Pois, de certa forma, o found footage é uma maquiagem que serve mais a esconder
as falhas e a pobreza do filme.
O fato de “A Visita”, o novo filme de M. Night
Shyamalan, ser um found footage é a prova inconteste do caminho decadente que
ele já trilha a algum tempo.
Não que o found footage seja, em si, o vilão da
história.
No início houveram trabalhos intrigantes e
curiosos antes que esse estilo fosse completamente saturado pelo uso excessivo
que a indústria fez ao longo dos últimos anos, sobretudo nos gêneros de terror
ou suspense.
Cito três grandes exemplos desses bons
trabalhos: “A Bruxa de Blair”, “Cloverfield –Monstro” e “Rec”.
Os pioneiros dessa técnica são, para muitos, o
clássico “A Tortura do Medo”, de Michael Powell, e o tenebroso “Holocausto
Cannibal”, mas em ambos a linguagem se alterna entre a narrativa
cinematográfica normal e a câmera em primeira pessoa do found footage.
“A Bruxa de Blair” é, portanto, o primeiro
realizado inteiramente como um found footage.
Mas eram outros tempos:
1999. E o estilo documental do filme, aliado à percepção de que tudo aquilo
pudesse ser real, conferia uma autenticidade que só intensificava a experiência
de assisti-lo. “A Bruxa de Blair” era, à época, um filme genuinamente
apavorante.
Com “Cloverfield”, de 2008, a coisa era um
pouco diferente. A linguagem adotada para o filme era só mais um dos muitos
detalhes com os quais o produtor J.J. Abrahams (e ele era somente produtor,
reparem nisso) incrementava esses trabalho; não à toa, sua tardia continuação,
“Rua Cloverfield, 10” não é filmado em found footage.
“Rec”, o filme de zumbis espanhol de 2007, por
sua vez, é um trabalho europeu, também ele carregado de inventividade e
propósito.
Salvo esses três exemplos, os filmes de found
footage nunca se justificaram de fato (com a possível exceção do primeiro
“Atividade Paranormal” cuja linguagem da câmera servia para contornar o
baixíssimo orçamento; mas mesmo esse filme, agora já com cinco continuações, já
teve seu apelo completamente esgotado).
Quando foi lançado nos anos 1970, por Ruggero
Deodato, a intenção por trás dos trechos em found footage de “Holocausto
Cannibal” eram elevar o já desgastado nicho de filmes italianos de canibais a
um novo patamar, convencendo a audiência da autenticidade das mortes mostradas,
ainda que no final, tudo fosse só um filme. Tirando a excessiva violência
exploitation do período, era exatamente essa a intenção também dos diretor
Eduardo Sanchez e Daniel Myrick em “A Bruxa de Blair”, no que foram muito bem
sucedidos: Por meses, o público discorreu, assombrado, se aquelas imagens eram
reais.
Mas eram outros tempos. A internet ainda
engatinhava no fim da década de 1990, e a velocidade de informação ajudou a
disseminar o culto em torno do filme, ao invés de esmiuçá-lo. Hoje em dia, isso
é diferente: Não há qualquer propósito para um diretor de cinema que se preze
valer-se de uma simulação de realidade como o found footage, se o expectador
poderá, com um único clique, descobrir na internet se a história por trás do
filme é real ou não.
Em “A Visita”, portanto, o
diretor M. Night Shyamalan desce, por conta própria, ao nível dos cineastas
medíocres.
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