A Nova York que Scorsese retrata aqui é tão
plena de corrupção e degradação moral quanto era a Nova York mostrada por ele
em “Taxi Driver”, em “Caminhos Perigosos”, ou em “Gangs de Nova York”.
Aliás, “A Época da Inocência” estabelece com “Gangs...”
um diálogo formal que vai muito além da escalação de Daniel Day-Lewis para o
elenco de ambos os filmes.
O interesse de Scorsese está nas mazelas que se
acumulam em todo e qualquer ambiente idealizado pelo homem, e as engrenagens
que levam esse microcosmo a implodir.
Neste filme, o mestre trabalha com uma
sociedade frívola de regras a serem cumpridas e aparências a serem mantidas. E em
meio à sociedade burguesa da Nova York de 1870, a aparência era tudo. O diretor
reforça essa obsessão dando a seu filme uma beleza tamanha que chega a ser
opressora. As cenas, de encher os olhos, emolduram assim um ambiente onde todas
as coisas tem seu devido lugar e hora, e tudo é uma questão de negociação e
cálculo.
Em princípio, para o vistoso e desenvolto
Newland Acher (Daniel Day-Lewis, preciso) esse parece ser um local perfeito para
sua ascensão: Advogado, no domínio da verve para conversação, elegante a ponto
de já ter uma noiva perfeita prestes a virar esposa (Winona Ryder, num trabalho
meticuloso), Acher faz parecer que aquele é seu habitat natural.
Não é. Ele só se dará conta disso quando conhecer
a Condessa Olenska (Michelle Pfeiffer, sensacional), prima de sua noiva, e
cujos atrevimentos cometidos a pouco tempo lhe valeram péssima fama entre os
aristocratas. Ao lado dela, Acher sente uma identificação que irá levar ao
amor, e esse amor terá de ser sufocado nos anos por vir, em função das escolhas
que ambos farão, sobretudo, para continuar a viver no mundo em que vivem.
Como em “Taxi Driver” é o amor (ou a obsessão)
por uma mulher o combustível que alimenta o tormento inapelável de seu
protagonista, mas, como em “Gangs de Nova York”, essas questões pairam
atrativas, sobre o filme, na medida em que eles são menos uma história sobre
paixões escondidas e mais uma incisiva, essencial e impiedosa observação
antropológica de Scorsese, tão fascinado que é pelos catalisadores que o ser
humano elabora para sua própria destruição e lamento, como também pelos
artifícios que o cinema teve, tem e sempre terá, para evidenciar as mais
variadas facetas dessa síntese.
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