sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Inverno de Sangue Em Veneza

Nas mãos de um realizador mais acomodado, a trama de “Inverno de Sangue Em Veneza” em sua simplicidade quase brutal, não renderia mais que um curta-metragem. Isso porque seu roteiro captura praticamente a essência de um conto de terror: Aquele momento em que a banalidade dos dias que se seguem é corrompida por um instante do mais absoluto pavor, comprometendo assim, tudo o que faremos depois.
Nas mãos de alguém como Nicolas Roeg, essa premissa serve –como em todos os títulos de sua desigual filmografia, mas sobretudo os primeiros –para uma sondagem até indiscreta das modificações que as escolhas do ser humano infligem em seu bem-estar, e o dos outros à sua volta.
A beleza plástica de Veneza (tão mais bela quando capturada pelas imagens gélidas, oníricas e sugestivas obtidas por Roeg que, vale lembrar, era diretor de fotografia) parece ser o lugar perfeito para John (Donald Sutherland) e Laura Baxter (Julie Christie, belíssima numa audaciosa cena de nudez e sexo com Sutherland) encontrarem um momento de alívio após o luto opressor pela morte acidental da filha. Indícios sinistros, contudo, não deixarão que a passagem do casal pela cidade seja tranqüila.
Na visão sempre desigual de Roeg (e que ele levou a vários outros projetos nos quais passeou pelos mais variados gêneros) os detalhes corriqueiros do dia a dia conjugam um cenário rico em que o horror pode instalar-se e ocultar-se, espreitando a vida de pessoas normais com a perene ameaça de uma tragédia em curso. Esse clima absolutamente impecável do qual a direção se vale responde pela grande razão desta obra constar entre os grandes filmes de terror já produzidos. OK, há outra razão: O susto, repentino e genuíno, que ele prega no expectador na cena fatídica do encontro com o suposto “fantasma” da garotinha.
Como em seus outros filmes também, há em Roeg uma necessidade patológica e filosófica em remover o sentido da jornada de seu protagonista, arremessando suas certezas e esperanças contra as ironias maldosas do mundo real.

Aqui, esta postura é, por demais, amedrontadora!

Nenhum comentário:

Postar um comentário