Matteo Garrone já provou que é um realizador
talentoso, o italiano “Gomorra” está aí para mostrar isso, E esta nova obra, de
apelo, ambientação e atmosfera absolutamente distintos daquele trabalho, vem a
mostrar também que ele pode fazer muito mais, inclusive em face das ocasionais
restrições que diretores autorais encontram quando trabalham com orçamentos de
estúdios e elencos internacionais.
“O Contos dos Contos” é, em sua natureza,
maravilhosamente subversivo: Um apanhado de histórias ligeiramente interligadas
que ilustram a maneira como os contos de fadas eram relatados na Europa antes
dessas histórias serem pasteurizadas pelas animações clássicas da Disney, que
lhes podou tudo que tinham de grotesco, de bizarro e de mordaz.
A primeira história fala sobre uma amargurada
rainha (Salma Hayek) que não pode ter filhos. Entretanto, um sinistro
desconhecido lhe dá uma receita para realizar seu sonho: Comer o coração de um
monstro marinho cozido por uma virgem.
Ás custas da vida de seu próprio marido (John
C. Reily), o rei, ela consegue o que quer e fica grávida, assim como também
fica a virgem escolhida para o ritual (!). As duas dão à luz, cada qual à um menino,
ambos albinos e idênticos. Os dois, à medida que crescem, partilham de uma
ligação que a rainha, aflita, não é capaz de romper.
A segunda história mostra um outro rei,
conquistador e mulherengo (Vincent Cassel) que se apaixona por uma voz
celestial, e fica obcecado em conhecer e desposar de sua dona, sem saber que se
trata de uma anciã. A mulher faz de tudo para ludibriar o monarca, o quê pode
fazer com que ela e sua irmã, também idosa, flertem com um perigo mortal.
A terceira história acompanha um rei (Toby
Jones) tão negligente com sua bela filha, a princesa (Zoe Kazan) que uma pulga
de estimação lhe inspira mais carinho do que ela (!), quando perde seu “animalzinho”
o monarca coloca a mão da filha numa disputa absurda, levando ela a casar-se
com um ogro (!!).
Longe de ser uma obra para o público infantil,
o filme de Garrone é carregado de nudez, de elementos sexuais, absurdos,
fatalismo e abusos que parecem feitos propositadamente para chocar, e tentam
escancarar tudo o que, na melhor das hipóteses, as histórias da carochinha, no máximo,
sugeriam.
Com sua narrativa imbuída de refinamento,
certamente à vontade com a acidez do material que manipula, e auxiliado pelo
comprometimento notável de seu elenco, ele conquista um resultado dos mais
curiosos e intrigantes.
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