sexta-feira, 12 de agosto de 2016

O Conto dos Contos

Matteo Garrone já provou que é um realizador talentoso, o italiano “Gomorra” está aí para mostrar isso, E esta nova obra, de apelo, ambientação e atmosfera absolutamente distintos daquele trabalho, vem a mostrar também que ele pode fazer muito mais, inclusive em face das ocasionais restrições que diretores autorais encontram quando trabalham com orçamentos de estúdios e elencos internacionais.
“O Contos dos Contos” é, em sua natureza, maravilhosamente subversivo: Um apanhado de histórias ligeiramente interligadas que ilustram a maneira como os contos de fadas eram relatados na Europa antes dessas histórias serem pasteurizadas pelas animações clássicas da Disney, que lhes podou tudo que tinham de grotesco, de bizarro e de mordaz.
A primeira história fala sobre uma amargurada rainha (Salma Hayek) que não pode ter filhos. Entretanto, um sinistro desconhecido lhe dá uma receita para realizar seu sonho: Comer o coração de um monstro marinho cozido por uma virgem.
Ás custas da vida de seu próprio marido (John C. Reily), o rei, ela consegue o que quer e fica grávida, assim como também fica a virgem escolhida para o ritual (!). As duas dão à luz, cada qual à um menino, ambos albinos e idênticos. Os dois, à medida que crescem, partilham de uma ligação que a rainha, aflita, não é capaz de romper.
A segunda história mostra um outro rei, conquistador e mulherengo (Vincent Cassel) que se apaixona por uma voz celestial, e fica obcecado em conhecer e desposar de sua dona, sem saber que se trata de uma anciã. A mulher faz de tudo para ludibriar o monarca, o quê pode fazer com que ela e sua irmã, também idosa, flertem com um perigo mortal.
A terceira história acompanha um rei (Toby Jones) tão negligente com sua bela filha, a princesa (Zoe Kazan) que uma pulga de estimação lhe inspira mais carinho do que ela (!), quando perde seu “animalzinho” o monarca coloca a mão da filha numa disputa absurda, levando ela a casar-se com um ogro (!!).
Longe de ser uma obra para o público infantil, o filme de Garrone é carregado de nudez, de elementos sexuais, absurdos, fatalismo e abusos que parecem feitos propositadamente para chocar, e tentam escancarar tudo o que, na melhor das hipóteses, as histórias da carochinha, no máximo, sugeriam.

Com sua narrativa imbuída de refinamento, certamente à vontade com a acidez do material que manipula, e auxiliado pelo comprometimento notável de seu elenco, ele conquista um resultado dos mais curiosos e intrigantes.

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