O pertinente diretor francês Luc Besson ficou
mais de uma década sem entregar um grande filme quando, à partir de “Joana D’
Arc”, de 1999, e a obscura animação “Angel-A”, de 2005, passou a dedicar-se
mais à produção de filmes de ação, e à realização de obras voltadas para o público
infantil –alguns de seus únicos créditos são a direção da trilogia “Arthur e Os
Minimoys” e a aventura francesa com cara de filme para TV, “As Múmias do Faraó”.
O quê é lamentável para quem é fã do cinema
pulsante e homeopaticamente transgressivo que ele exercia nos anos 1980 e 90.
Em 2011, contudo, ele voltou à carga, primeiro
com o despretensioso drama “Além da Liberdade”, e depois em 2013, com o ótimo “A
Família” –uma sensacional comédia sobre mafiosos que brincava com a imagem e
persona do ator Robert De Niro, seu protagonista.
No ano seguinte, Besson aparentemente com fôlego
renovado, entregou uma nova obra este curioso “Lucy” –e em 2017, ele lançará a
adaptação da cultuada HQ, “Valerian e A Cidade dos Mil Planetas”, um projeto
que tem ares de “filme dos sonhos”, já que é evidente em toda sua obra –sobretudo,
no início –que Besson sempre foi obcecado por quadrinhos europeus de ficção
científica, em especial os oriundos da revista “Metal Hurlant”.
Mas, vamos falar sobre “Lucy”.
Extraviada em algum canto obscuro de Hong Kong,
a avoada americana Lucy (Scarlet Johansson, que se revela sensacional
praticamente em qualquer papel) torna-se, involuntariamente, mula de carga para
um poderoso traficante que coloca em seu estômago um pacote de droga
experimental na intenção de contrabandear o produto para a Europa.
Mas um imprevisto acontece e o saco plástico se
rompe dentro dela, liberando a droga em seu organismo. Sofrendo de um inusitado
efeito colateral, Lucy passa a acessar novas áreas de seu cérebro que vão além
dos usuais 10% que, afirmam os cientistas, o ser humano consegue utilizar. Conforme
vai se aproximando mais e mais dos 100% de capacidade cerebral, Lucy adquire
mais poderes, que a tornam quase onipotente e a levam a procurar um renomado
especialista (Morgan Freeman, imponente como sempre) enquanto tem a máfia
chinesa e alguns policiais em seu encalço.
A verdade é que chega a ser motivo de júbilo
esse então retorno de Besson à direção de filmes que fogem das restritivas
pechas infanto-juvenis: A própria premissa inventiva e interessante de “Lucy” é
o mais salutar dos indicativos de que o ímpeto criativo e o inconformismo
formal que definiam Luc Besson, e que moldaram filmes maravilhosos sob sua
assinatura, são qualidades intrínsecas que ele não perdeu, durante sua
inexplicada ausência da cadeira de diretor. As cenas de ação, pulsantes e orquestradas
com precisão são então um desbunde à parte, mas “Lucy” se destaca de verdade em
meio aos exemplares do cinema comercial por sua audaciosa tentativa em
mergulhar em idéias e conceitos que vão além de nossa imponderabilidade,
abrindo espaço para questões sobre a realidade, o tempo e a existência, com uma
saudável e juvenil curiosidade.
Não chega e ser um conceito
que mudará o cinema, como foi “Matrix” em 1999, mas é um trabalho digno de pura
admiração e certamente muito beneficiado pela versatilidade da atriz Scarlet Johansson,
que equilibra muito bem beleza e competência no papel-título.
Nenhum comentário:
Postar um comentário