As câmeras do diretor Wayne Wang parecem
dispostas e justapostas, prontas para tentar registrar o sentimento de urgência
que dominava Hong-Kong, em 1996-7, quando se deu a transição de seu então
domínio inglês (durante o qual tornou-se um pólo de atividade
econômico-capitalista) de volta para suas raízes com a recuperação para a
China.
Nessa intenção à uma fusão dos dois estilos
quase antagônicos que Wang difundiu em seus mais reconhecidos trabalhos: A
improvisação orgânica entre a câmeras e os atores, típica de “Cortina da
Fumaça” e particularmente sua continuação, o filme-colagem “Sem Fôlego”; e o
tom dramático de vibração clássica, mas de insuspeito charme sedutor, que se
percebe em “O Clube da Felicidade e da Sorte”.
Como naquela obra, são as mulheres quem
potencializam e catalizam toda atenção e interesse do expectador –e aqui elas
são a deslumbrante Gong Li, e uma ainda jovem Maggie Cheung, que quase rouba o
filme numa mal aproveitada trama paralela.
Mas, infelizmente, Wang nomeia como
protagonista o jornalista inglês interpretado por Jeremy Irons –e começam aí
alguns de seus problemas.
Parece ser pouco envolvente a trama que o
coloca no centro de todas aquelas mudanças, e a fleuma de enfado britânico com
a qual Irons usa na composição de seu personagem –e que ele soube modular com
exemplar precisão em outras obras –não ajuda em nada neste caso.
Isso não se intensifica nem quando John, seu
personagem, um correspondente inglês cobrindo os acontecimentos em Hong Kong,
descobre sofrer de leucemia, o quê lhe tolherá a vida em poucos meses.
Sua grande frustração é, portanto, não ter mais
tempo para resolver seus assuntos pendentes, sobretudo, os afetivos, que dizem
respeito diretamente à Vivian (Gong Li e sua beleza incontornável), imigrante
chinesa e dona de um bar no centro da cidade, por quem o coração de John já
está enredado, mas que o rejeita sistematicamente devido à pouca estabilidade
que ele representa; ela, na realidade aguarda, numa vã esperança, o pedido de
casamento de Chang (Michael Hui), seu amante e um homem de negócios ascendente
em Hong Kong.
Vivian, então, simboliza Hong Kong cujas raízes
históricas e culturais –e outras razões que na maioria das vezes, nem ela sabe
dizer quais são –a impelem na direção de Chang (a China para a qual Hong Kong
está prestes a voltar), e a afastam, traduzidas em forças poderosas do destino,
cada vez mais do apaixonado John (a Inglaterra que, com todas as suas boas
intenções, levou a própria Hong Kong e seu povo a experimentar os extremos
violentos de seu sistema econômico).
Seria uma metáfora cheia de graça e primor não
fossem algumas escolhas equivocadas. A pior delas: O absolutamente sem graça,
sem sal e sem carisma Michael Hui que, como Chang, prejudica até a bem
construída personagem de Gong Li –o expectador passa o filme inteiro a se
perguntar o porque daquela bela mulher preferir aquele chinês desinteressante,
tacanho e apático no lugar do sempre vistoso e elegante Jeremy Irons –mesmo que
ele não esteja em seus melhores dias. Ou talvez, sendo esta uma obra feita para
e pelo Ocidente, fosse essa mesma impressão o objetivo almejado.
Antes o objetivo fosse
fazer um grande filme.
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