quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Picnic Na Montanha Misteriosa

São claras as razões que tornaram este um dos filmes australianos mais importantes dos anos 1970: Nele existem inúmeros pequenos grandes filmes –temos a afiada crítica social jamais destituída da alegoria que a torna tão relevante para além de seu tempo e lugar; temos o filme independente respirando pela narrativa, evidenciado na pouca disposição do diretor em ceder às expectativas do público; temos o filme de suspense, onde o mistério, tornado quase fantasmagórico ao longo da duração, vai esmagando as convicções dos personagens; temos o poético drama juvenil onde o foco principal são as jovens perplexas e sua vã tentativa de desabrochar para uma maturidade diante do opressor mundo adulto; e temos o filme sobre um desaparecimento –este baseado em fatos reais –que enganosamente sugere ser o grande cerne da produção, mas é, em inúmeros níveis, apenas seu pretexto. Todos estes diferentes filmes se justapõe numa perspectiva enigmática graças ao singular trabalho de Peter Weir, pois ele procura em cada um deles um fragmento que contribua para elucidar a resposta que parece tão inalcançável: O quê afinal aconteceu àquelas quatro meninas naquela nebulosa tarde em Hanging Rock? Para onde foram? Que fim todas elas tiveram?
Esse mistério insolúvel erguido pela austera direção de Weir (tão denso e tangível quando uma neblina cerrada) não se dissipa nem mesmo quando uma das jovens desaparecidas é encontrada: A indignação das cenas que se seguem, quando fica claro que, em seu trauma, é impossível extrair dela qualquer relato que seja, é tão frustrante para o expectador quanto o é para os personagens.
O mistério não é necessariamente crível, ele é apenas irreprimível –em sua sensibilidade única, Weir ressalta o fato alarmante de que a resposta pode nunca mais chegar –traduzida na inocente e fracassada obsessão de um jovem em não deixar-se desistir em sua busca desesperada. Mas há de se notar que todo esse sentimento de inconformismo (ou algo assim) existe como um catalizador para os personagens e suas obsessões pessoais diretamente à esse evento relacionadas: É escolha de cada um seguir em frente com suas vidas, ou deixar de viver, para em lugar disso, mastigar durante toda a sua existência as causas e efeitos de uma dúvida inexplicável.
Para além das percepções atribuídas pelo perspicaz diretor Peter Weir à este filme, a autora do livro, Joan Lindsay, (cujo roteiro, ela própria escreveu), tinha uma história de 18 capítulos dos quais 17 foram publicados –e, portanto, adaptados para o cinema. O décimo oitavo capítulo, e que trazia a resolução do grande mistério, só poderia ser publicado após a morte da escritora (ocorrida em 23 de dezembro de 1984).
Quando finalmente o grande segredo de Hanging Rock foi publicado seu pendor fantasioso frustrou as indagações daqueles que aguardavam por uma explicação à altura de sua expectativa –o filme de Peter Weir, contudo, com sua impassível névoa de mistério, permanece com sua impecável aura de sonho inconcluso.

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