Já de começo se pode perceber algo de diferente
em “Logan”. Diferente até mesmo de “Deadpool” cujo imenso sucesso propiciou a
alta censura da qual este filme também se beneficiou: Os fãs podem, enfim, ver
Wolverine no auge de sua selvageria, estraçalhando os inimigos e extraindo
litros de sangue que suas garras afiadas não tiveram a chance de fazer em
nenhum dos filmes anteriores.
Entretanto,”Logan” é também adulto em sua
proposta, em seu intimismo, na decisão convicta do diretor James Mangold e do
astro Hugh Jackman em finalmente construir um filme que fizesse jus à ambigüidade
moral e à angústia que o personagem principal apresenta de maneira tão
exuberante nos quadrinhos.
Uma pena que, ao buscar inspiração na
graphic-novel “O Velho Logan” (ambientada num futuro algo pós-apocalípitico
onde o herói se vê em uma fase crepuscular da vida e muitos dos personagens
conhecidos já morreram), a premissa afasta a possibilidade de ter os demais
X-Men a participar desse projeto (o único remanescente deles é um envelhecido e
decadente Prof. Charles Xavier, aqui sofrendo de uma doença degenerativa
mental): O ano é 2029. Já contam décadas que não nascem novos mutantes no mundo
(e tal detalhe já aproxima bastante o filme de Mangold, também da memorável
ficção “Filhos da Esperança”, de Alfonso Cuarón). Logan, outrora conhecido como
Wolverine (Jackman, fazendo valer cada instante desta sua despedida do papel),
agora trabalha quase anônimo como motorista particular. Junto com ele moram o
mutante Caliban (Stephen Merchant, substituindo o ator que fazia uma versão
mais agressiva deste mesmo personagem em “X-Men Apocalypse”) e seu antigo
mentor, o agora senil Xavier (Patrick Stewart, entregando uma inspirada
atuação).
Os poderes de Logan já não são mais os mesmos,
e sua perspectiva de vida envolve a possibilidade de um suicídio –ele trás
consigo uma única bala de adamantium na eventual chance de usá-la em si mesmo
–porém, ainda assim, ele guarda algum dinheiro para comprar um barco e partir
para o mar.
Neste cenário inóspito, surge uma garotinha,
Laura (a surpreendente Dafne Keen), com poderes similares até demais aos de
Wolverine –e ele logo descobrirá qual a espantosa origem dela –e perseguida
pelo caçador de recompensas cibernético Donald Pierce (Boyd Holbrook) a mando
de uma corporação tão suspeita quanto perigosa.
Logan deve conduzi-la a um refúgio em algum
lugar da Dakota do Norte e até lá, certamente, se exasperar com seus
perseguidores naquele que pode ser último ato de heroísmo.
O entardecer do herói é, assim, emoldurado por
uma produção que se distancia muito dos elementos que definiram a série “X-Men”
–e que ainda estavam presentes nas incursões solo do personagem –“Logan” guarda
elementos de um road-movie, de um épico pós-apocalíptico que lembra “Mad Max”,
de drama e de faroeste: Sua referência mais explícita por sinal é o épico de
George Stevens, “Os Brutos Também Amam” que aparece literalmente na cena em que
Xavier e a garotinha assistem ao próprio filme num quarto de hotel,
pontualmente na própria dinâmica dos personagens (a relação entre Logan e Laura
guarda diversos paralelos entre a do pistoleiro Shane e o garotinho, no clássico),
e explicitamente na menção magistral feita durante o prólogo poderosamente
emocionante e corajoso.
Hugh Jackman não é mais o Wolverine, e será
certamente um desafio para o estúdio encontrar um intérprete à sua altura para
o personagem que ele interpretou de modo tão perfeito nos últimos dezessete
anos. Como consolo, nos resta este filme desigual, lúgubre, dramático e formidável
que, em sua despedida, ele fez questão de nos entregar.
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